Em 25 de Abril de 1974, estava eu em Angola a cumprir uma Comissão de Serviço, no Exército Português, razão pela qual não vivi pessoalmente os acontecimentos relacionados com a Revolução dos Cravos que terão ocorrido no Sardoal, vividos pelos Sardoalenses com maior ou menor intensidade e paixão.
Apenas regressei do Ultramar em 3 de Abril de 1975.
Talvez, por isso, tenha sentido sempre muita curiosidade de saber como foram vividos, na minha Terra, aqueles meses conturbados que em muitos outros sítios deixaram sequelas que ainda hoje, trinta anos depois, se fazem sentir.
Na tentativa de satisfazer a minha curiosidade consultei as fontes documentais possíveis, nomeadamente a imprensa regional da época, as actas da Câmara Municipal, a correspondência recebida e expedida e auscultei muitas pessoas que aqui viviam e vivem e, estranhamente para mim, não encontrei muitas referências, nem senti que as pessoas guardassem memórias especiais daquele tempo.
Em 29 de Abril de 1974, a Câmara Municipal de Sardoal reuniu extraordinariamente, convocada pelo seu Presidente, Dr. Álvaro Andrade e Silva Passarinho, com a presença dos Vereadores de então, Senhores Arnaldo da Silva Cardoso e Armando Navalho e aprovou, por unanimidade a seguinte proposta do Senhor Presidente:
“Sendo um facto que todo o território nacional se encontra sob autoridade da Junta de Salvação Nacional e que na sua proclamação ao País por ela foram dadas garantias pautadas, na sua acção e propósitos, de manutenção do direito, justiça e normas internacionalmente aceites, é dever desta Câmara, em salvaguarda da ordem, tranquilidade e bem estar dos seus munícipes, garantir à Junta, que reconhece como Governo legítimo do País, a sua leal e sincera colaboração para prosseguimento dos desígnios proclamados.
Mais deliberou endereçar à Junta de Salvação Nacional telegrama dando-lhe notícia desta deliberação que constitui o único motivo da presente reunião, telegrama que terá o texto seguinte:
Câmara Municipal Sardoal reunida extraordinariamente deliberou saudar em Vossa Excelência a Junta de Salvação Nacional, oferecendo todo o seu apoio e leal colaboração para bem de Portugal.
O telegrama será dirigido a: Presidente da Junta de Salvação Nacional – Palácio Cova da Moura – Lisboa.
Em 16 de Maio de 1974, realizou-se uma reunião ordinária da Câmara Municipal, sob a presidência do Dr. Álvaro Andrade e Silva Passarinho, estando presentes o Vice – Presidente, Sr. Francisco Alves Paulino e os Vereadores Srs. Arnaldo da Silva Cardoso e Armando Navalho, em que foi discutido o seguinte ponto:
Situação da edilidade frente ao Movimento do 25 de Abril.
O Senhor Vice – Presidente dirigindo-se ao Senhor Presidente disse ser seu desejo insistir no sentido de esclarecer a situação , por lhe parecer oportuno e acertado colocar, por si, nas mãos da Junta de Salvação Nacional, o mandato que lhe foi conferido pelo Governo deposto, embora a cinquenta e cinco dias do termo do seu mandato.
Que a esta reunião se deslocou, pela primeira vez desde há alguns anos, para esclarecer a sua situação de solidariedade com a Junta de Salvação Nacional, não lhe parecendo aceitável que tendo sido designado para o lugar pelo Governo deposto, continuar a ocupar um cargo que, só com muito sacrifício e esforço, aceitou.
Por isso, afirmou desejar transmitir superiormente o seu ponto de vista, considerando seu dever informar a Câmara, desta sua decisão.
O Senhor Presidente afirmou então que, como já havia dito ao Senhor Vice – Presidente, além da sua opinião pessoal, constitui o entendimento imediato por parte das edilidades do País, o exercício das funções que lhe incumbem sem o que, inevitavelmente constituiria prejuízo e perturbação na administração pública – haverá que tomar em consideração que, como lhe foi afirmado por colegas seus, em opinião de que já partilhava poder um pedido colectivo de demissão ser interpretado com razão, pela Junta, como atitude de propositado intuito desagregador e perturbador.
Por isso não havia solicitado a sua exoneração embora, repetindo, esteja em pleno acordo com o Programa da Junta de Salvação Nacional.
O senhor Vereador Cardoso, secundado pelo seu colega Navalho, considerou que seria sensato por à disposição da Junta de Salvação Nacional como se reafirmam plenamente identificados, na sã política proclamada, o mandato da edilidade já que em última análise, todos comungam dos ideais proclamados pela Junta, apenas pretendem servir o seu País na promissora harmonia nacional, livre e ordeiramente conquistada.
O Senhor Presidente propôs então que desta deliberação fosse dado conhecimento à Junta de Salvação Nacional, para os efeitos que, em seu alto critério, mais tivesse por conveniente.
Nesta sessão foi tomada uma importante deliberação que nada tinha a ver com o 25 de Abril, relacionada com a SARDAN, cujo teor é o seguinte:
Presente a comunicação da SARDAN – Iniciativas do Sardoal – Indústria e Turismo, SARL, de quatro do corrente, na qual se pretende informação sobre se a Câmara concorda com a construção da fábrica, com vista à preparação do terreno com inevitável corte de árvores e sobreiros.
Deliberou a Câmara não só concordar com a instalação da SARDAN, na Tapada do Costa .- Fonte da Estrada, como também apoiar, como sempre tem feito, o que possa significar interesse para a SARDAN, o que equivale à defesa dos interesses do Concelho.
A Câmara reconheceu absoluta necessidade no abate dos sobreiros ali existentes, pois só assim as construções poderiam ser fei
Na acta da reunião ordinária de 5 de Junho de 1974, consta o seguinte registo:
Exoneração do Senhor Presidente: O Senhor Presidente informou que, por força do Decreto – Lei número 235/74, de três do corrente, não deverá estar em exercício na próxima reunião ordinária da Câmara, pelo que faz exarar a seguinte saudação: “Cessando as minhas funções de Presidente da Câmara Municipal , no próximo dia 18, desejo testemunhar a todos os que comigo colaboraram com dedicação e sinceridade na resolução dos magnos problemas do nosso querido concelho, os meus agradecimentos.
Não posso esquecer, neste momento, também o bom povo de todo o concelho, pedindo-lhes em primeiro lugar, que perdoe insuficiências e erros, tão fáceis de cometer numa missão espinhosa e complexa como é a de Presidente de uma Câmara Municipal. Em segundo lugar, pedir a todos que aceitem uma respeitosa saudação de amizade, fazendo votos de um intenso progresso e realização de tudo o que o concelho aspira.”
Na acta da reunião ordinária de 19 de Junho de 1974, consta, ainda, o seguinte registo:
“Ex – Presidente: O Senhor Ex – Presidente da Câmara, finda a leitura da acta e depois de por ao corrente de pormenores sobre diversos assuntos os Senhores Vereadores, pediu licença para se retirar e para agradecer às pessoas presentes que consigo trabalharam a bem do progresso do concelho e de quem sempre recebeu a mais ampla, construtiva e sincera colaboração.
Não deixou de, dirigindo-se ao Chefe da Secretaria, pedindo-lhe que transmitisse, mais uma vez, aos funcionários a sua estima e o seu agradecimento pela lealdade com que com ele sempre serviram.
Que de todos leva a maior saudade e a todos desejou as maiores venturas pondo à disposição dos Senhores Vereadores, o produto da sua experiência e conhecimento dos problemas do concelho que considera ficarem em mãos honradas e competentes.”
Até 11 de Outubro de 1974, a gestão da Câmara Municipal ficou a cargos dos Senhores Vereadores Arnaldo da Silva Cardoso e Armando Navalho, tendo nesta data tomado posse a Comissão Administrativa presidida pelo Senhor António Pombo, com os vogais Senhores Constâncio Ambrósio e Fernando da Silva Rosa.
Só em Novembro foi eleita, num plenário de moradores, uma Comissão Administrativa para a Junta de Freguesia de Sardoal. Tinha como Presidente o Sr. António Rodrigues Garcia, de Entrevinhas, como Secretário o Sr. Silvino Mestre Ascenso, de Andreus e como Tesoureiro o Sr. Júlio Nunes Grácio, da Vila de Sardoal.
Em 25 de Abril de 1974 eram os seguintes os titulares dos principais cargos públicos do Concelho de Sardoal:
Delegado Escolar: José de Matos Afonso
Provedor da S. C. Misericórdia: Joaquim Mendonça
Presidente da Casa do Povo de Sardoal: Fernando Constantino Moleirinho
Presidente da Direcção da F.U.S.: João Carvalho Grácio
Pároco de Sardoal: Padre Manuel Ribeiro Farinha
Pároco de Alcaravela e Valhascos: Padre Manuel Lopes Nunes
Pároco de Santiago de Montalegre: Padre Manuel Matias
Sardoal, Abril de 2004