Dinamização do MFA no Sardoal – 1974

Via lembrança do Atrium – Boletim Cultural, n.º 8 de Abril/87.

No final de 1974, o Movimento das Forças Armadas fez deslocar ao Sardoal uma companhia de instrução de Comandos, para uma acção de dinamização cultural que durou 2 dias. Na reportagem do acontecimento diz-se, entre outras coisas, que o povo do Sardoal é formado por “pessoas simples” que são, “na sua maioria, gente despolitizada”. A respeito do contexto sardoalense em 1974, recomendamos os últimos parágrafos destas memórias pessoais de Abril e outros ecos sardoalenses da época.

Aqui transcrevemos a reportagem publicada pelo “Jornal do Exército”, n.º 181 de Janeiro de 1975.

Reportagem do Jornal do Exército

União Povo – Forças Armadas
O Batalhão de Comandos n.º 11 em Campanha de Instrução e Dinamização Cultural

O Batalhão de Comandos n.º 11, aquartelado na Amadora, fez deslocar uma companhia de instrução para a zona do Concelho de Sardoal, perto de Abrantes, dando cumprimento prático a um dos prioritários objectivos do M.F.A.: a união POVO-FORÇAS ARMADAS.
Dois dias em contacto permanente com a população da vila de Sardoal chegaram para que esta primeira experiência do Batalhão de Comandos tivesse resultados altamente positivos, deixando perspectivas optimistas para a continuação da iniciativa da campanha de Dinamização preconizada pelo M.F.A.
O Povo do Sardoal, formado, na sua maioria, por gente despolitizada – característica dominante dos meios rurais e resultante de uma das principais armas do anterior regime: o fomento da ignorância popular – bem cedo deixou transparecer o seu contentamento pela presença das Forças Armadas.
No primeiro dia, de manhã, decorreu no Cine-Teatro da Misericórdia uma sessão de convívio e de esclarecimento com a juventude escolar.
O Capitão MATOS GOMES, encarregado das actividade culturais, começou por fazer uma breve crítica ao antigo regime, explicando a necessidade do 25 de Abril e divulgando, em seguida, os principais objectivos do programa do Movimento das Forças Armadas, detendo-se, mais pormenorizadamente, no processo de democratização em curso, na descolonização, no saneamento, na política antimonopolista e na reconquista das liberdades.
A sessão decorreu com grande entusiasmo, tendo surgido dezenas de perguntas por parte dos jovens assistentes, que colaboraram, inteiramente, com as Forças Armadas.
À tarde, houve uma reunião com a população, no mesmo local, para esclarecimento de aspectos sanitários, nomeadamente higiene, alimentação e assistência materno-infantil, dirigida pelos médicos da Unidade, Aspirantes CORREIA e PARREIRA.
Será também de assinalar, que os dois médicos, durante os dois dias em que estiveram no hospital da Misericórdia, assistiram em consulta gratuita mais de meia centena de doentes por dia.
Pelas 19.30, encheu-se mais uma vez o Cine-Teatro da Misericórdia, na sessão de esclarecimento político-cultural sobre o Movimento do 25 de Abril e suas consequências.
Falaram o Major MORAIS, Comandante do destacamento do Batalhão de Comandos N.º 11 em instrução, e o Capitão MATOS GOMES que, depois, responderam às perguntas efectuadas por elementos da população, que se mostraram vivamente interessados em conhecer de viva voz a situação do país em que vivem e as intenções e objectivos do M.F.A.. Ouviram-se perguntas simples em palavras simples. Era o povo que perguntava. Era o povo que desejava esclarecimentos. Era o povo que afirmava, em cada pergunta, a sua vontade de participar na vida da Nação.
Sardoal parecia ter acordado de um longo sono. De todos os inquéritos que recolhemos, junto da população, evidenciou-se a unanimidade dos benefícios desta iniciativa do Batalhão de Comandos n.º 11. Discutia-se nos cafés, nas casas, no trabalho, e o povo reparou na mentira da restrição da política.
No dia seguinte, manhã, bem cedo, os elementos da Companhia de Comandos auxiliaram os pequenos proprietários rurais na apanha da azeitona e outros trabalhos de interesse para uma população envelhecida pela emigração.
– Já nem falamos no pagamento de 180$00 diários, porque o grande problema é que não há quem trabalhe. – Palavras de um homem, que aproveita as férias no seu emprego, em Lisboa, para vir ajudar os pais.
Portanto, foi com alegria bem justificada que os pequenos agricultores de Sardoal viram parte dos seus problemas resolvidos pela ajuda de elementos do Exército.
À tarde, houve um jogo de futebol, no campo da vila. As equipas de Sardoal e dos Comandos jogaram. Uma bola, vinte e dois homens, um árbitro arranjado à pressa e, sobretudo, convívio, alegria, confraternização.
O Batalhão de Comandos n.º 11, despediu-se, à noite, do Povo do Sardoal, com um sarau recreativo no Cine-Teatro, em que participaram elementos do Exército e do povo da vila, numa sala superlotada.
No fim, o Major MORAIS despediu-se em nome do Batalhão, tendo afirmado, a dada altura, que, pela primeira vez, na sua vida militar, tinha sentido profundamente a união do Exército com o povo. Um povo que fez demorar, depois, longos aplausos de agradecimento e que também, pela voz de gente simples, nos afirmou que estes dois dias ficaram na história boa da sua vila e que não serão esquecidos tão cedo.

Ora, graças ao Arquivo Histórico Militar e à disponibilização do catálogo fotográfico do exército, está agora publicamente acessível a reportagem fotográfica completa desses dois dias no Sardoal e Santa Margarida. O conjunto completo de 160 fotografias pode ser consultado directamente no arquivo, através deste link. Deixamos também aqui uma pequena selecção dessas fotos.

No Largo do Hospital e do Cine-Teatro
Praça da República
“As equipas de Sardoal e dos Comandos jogaram no campo da vila”
Contacto com a população
Sessão de convívio e esclarecimento no Cine-Teatro Gil Vicente
Junto ao Pelourinho
“Elementos da Companhia de Comandos auxiliaram os pequenos proprietários rurais na apanha da azeitona”