A poesia de Justo da Paixão sobre figuras sardoalenses

Justo Dias Rosa da Paixão nasceu no concelho de Abrantes em 1861. Destacado político republicano, foi Presidente da Câmara de Abrantes.

Justo da Paixão – fotografia do Álbum Republicano (1908)

Publicou sonetos sob o pseudónimo SADI-AZOR, nos jornais «O Povo de Abrantes», «A Foice», «O Baluarte», e «Baluarte» da cidade de Abrantes, e n’«A Nabância» de Tomar. Uma colectânea desses poemas, do período entre 8 de Agosto de 1915 e 17 de Novembro de 1929, foi publicado em 1932 no livro “Perfis: sonetos despretensiosos e humorísticos, retratando diversas pessoas de destaque do Concelho de Abrantes e doutros limítrofes” (Tipografia Couto). Desses, seleccionámos os sonetos que retratam pessoas que à época estavam mais ligadas ao Sardoal.

Ao senhor Dr. Raul Wheelhouse
Médico
Sardoal

Vou hoje d’abalada ao Sardoal,
Terra de gente amável e bemquista,
Velha ou antiga vila que s’avista
Da vetusta Tubuci medieval…

E vou lá, como é muito natural,
No modesto mister de retratista,
P’ra obter um cliché à simples vista
D’um ilustre ornamento medical…

Pois, muito habil e dextro em operar,
Tem provado saber de cirurgia,
Predicado que devo aqui frisar.

E além de tal sciência, ainda alia
O dom de defender e propalar,
A pura e liberal democracia!

Baluarte, 21-IV-1929

Ao senhor Rafael Alves Passarinho
Farmacêutico e Proprietário
Sardoal

Ainda em Sardoal deambulando,
Aproveitei o léo, a ocasião,
De retratar um outro cidadão
Que desde há tempo venho projectando.

Na farmácia ou botica acionando,
A vida gosa em f’liz disposição,
Sem recorrer ao jogo do gamão
Qu’o Tolentino em verso foi cantando.

Prégar a Democracia, é seu prazer,
E n’essa propaganda faz apêlo
À Verdade, à Razão, ao seu saber.

Demonstrando, portanto, n’um tal zelo
Ser firme, democrático, a valer,
Desde os pés à raiz do seu cabelo!

Baluarte, 28-IV-1929

Ao senhor Dr. David Serras Pereira
Advogado

Eis um doutor em leis d’aspectos vários;
Ora ameno ao falar c’os seus clientes,
Ora brusco a meter unhas e dentes
Nas contas dos seus pingues honorários.

Comtudo os consulentes tributários,
Reconhecem de resto convincentes,
Que na Arte e serviços concernentes,
S’estabelecem os preços arbitrários.

Além que, nas funções ou exercício
Da palavra e na sua escrivaninha,
Ele atesta finura e artifício…

Eu não faço alusão, algo escarninha,
Porqu’enfim, cada qual no seu ofício
Chega a brasa ou tição à su’sardinha!

Baluarte, 23-VI-1929


Ao senhor Abílio Napier (Rei Pan)
Poeta e Publicista
Lisboa/Sardoal

Eis-me ainda outra vez no Sardoal,
Onde vim p’ra saudar, com certo afan
Um vate distintíssimo: o Rei Pan,
A quem me liga um elo fraternal;

Porqu’às Musas afecto, é natural,
Irmãos sermos na Rima folgazã,
Na Bucólica ou Lírica aldeã,
Ou no Épico verso e Madrigal.

Mas, não é de ninguém irmão em Cristo,
Pois qu’adorando a Luz co’a alma acesa,
Condena a Treva, o Vago, o Imprevisto…

Um só culto professa, com firmeza,
Ao qual a Consciência imprime o visto
O Livre-Pensamento… a Natureza!

Baluarte, 29-IX-1929