Passeio: Na rota de moinhos e azenhas…

A beleza dos montes e dos vales, dos pinhais, florestas e campos de cultivo (hoje, infelizmente, poucos), das pequenas aldeias e da própria vila de Sardoal, que o verde abraça e envolve, das ribeiras que fazem o seu percurso por estas terras, as terras onde a água também cura, aquela maneira de as pessoas receberem quem vem – tudo isto faz o encanto deste concelho.

Na vila, o vasto património construído: capelas e igrejas, solares, casas, ruas e recantos, recordam outros tempos de presenças de nobres e visitas reais, de velhos ofícios, e reforçam a necessidade de aproveitamento das virtualidades da localização central do concelho de Sardoal, equidistante do mar e da fronteira, com excelentes condições de acessibilidade às principais vias de comunicação, que convida à exploração de um património de sítios, monumentos e territórios, que são, sem dúvida, uma das suas riquezas.

José Mattoso, Suzane Daveu e Duarte Belo, no seu trabalho “Portugal – O Sabor da Terra – RIBATEJO”, publicado pelo Círculo de Leitores para a EXPO 98, referindo-se à zona de transição do Ribatejo para a Beira Baixa, escreviam o seguinte:

“A norte do Tejo, estendem-se vastos planaltos cobertos de pinhal, que se vão elevando progressivamente até atingir, depois dos alinhamentos quartzíticos de Vila de Rei, a base das emaranhadas serras de xisto entalhadas a fundo pelo Zêzere e pelos seus afluentes. Esses planaltos são constituídos por rochas antigas de natureza diversa, amiúde ocultas por sedimentos terciários, em muitos lugares de constituição grosseira, o que não admira por estarem perto dos lugares elevados donde deslizaram. Acumulam-se no sopé da cordilheira Central e representam os vestígios de uma crise generalizada de erosão a qual se deu em época anterior ao encaixe dos vales actuais. A velha charneca, muito degradada, onde domina a monótona esteva, cobriu-se, já no nosso século, com pinheiros e eucaliptos, graças à mão do homem e à humidade trazida pelos últimos sopros vindos do Atlântico e que ainda atingem a região. De quando em quando aparecem algumas «baixas», regadas e férteis, isoladas umas das outras, onde se implantam aldeias e pequenas vilas.

As terras do Sardoal, Mação, Figueiró dos Vinhos, Vila de Rei, Cernache do Bom Jardim, Sertã, etc., eram outrora consideradas estremenhas, sem hesitação alguma. Podemos hoje incluí-las no Ribatejo? À primeira vista, assim parece, ao menos para as vilas mais meridionais, como o Sardoal e Mação, tão próximas de Abrantes. E todavia, nota-se que a própria divisão distrital terá aqui hesitado. A Sertã e Vila de Rei dependem administrativamente de Castelo Branco; ou seja, foram consideradas em 1836 como pertencentes à Beira Baixa, tal como Proença-a-Nova. Mas a recente divisão do país em Unidades Territoriais para fins Estatísticos agrupou estes concelhos, incluindo Mação, numa NUTE III a que se chamou «Pinhal Interior Sul». Trata-se de uma área que se pode considerar residual, por ser a menos povoada de todo o país (tem apenas uns 50 000 habitantes). Nesta divisão apenas o Sardoal ficou ligado a Santarém. Não há dúvidas que estas terras verdadeiramente marginais, desde sempre pouco povoadas, e que o êxodo rural esvaziou ainda mais, não têm nenhuma marca regional nítida. Verifica-se aqui, uma vez mais, que uma região só se pode caracterizar a partir da sua parte central ou dominante e que as suas fronteiras são quase sempre imprecisas e diluídas. “

Este texto evidencia, claramente, as características de transição geográfica do concelho de Sardoal, na confluência de três regiões bem distintas, como o são o Ribatejo, o Alentejo e a Beira Baixa, onde foi beber as suas influências culturais, que se entrelaçam harmoniosamente, de forma genuína e quase única.

Ao longo do percurso que vamos efectuar não vai ser necessária a utilização de um pedómetro, porque os passos podem ser dados de forma descansada e é à visão que cabe o papel principal, podendo os papéis secundários ser desempenhados pelo olfacto e pela audição.

Estamos na Praça da República, sala de visitas da vila de Sardoal, onde se cruzam memórias colectivas de séculos, consubstanciadas de forma mais evidente no Pelourinho, símbolo do poder e autonomia municipal e no painel cerâmico de Gabriel Constant, colocado na parede da Capela do Espírito Santo, onde se pode ler um pequeno trecho da “Tragicomédia Pastoril da Serra da Estrela”, em que Gil Vicente faz intervir dois «lagartos», forma pela qual, no século XVI, já eram conhecidos os habitantes do Sardoal.

No curto percurso urbano que vamos efectuar, seguimos pela Rua Mestre do Sardoal, em direcção à Igreja Matriz da Paróquia de Sant’Iago e S. Mateus de Sardoal, um templo que começou a ser construído em meados do século XV, no reinado de D. Afonso V e onde co-existem, de forma singela e harmoniosa estilos arquitectónicos distintos, como o gótico, o renascença e o barroco e onde se guarda uma das jóias do património artístico sardoalense, os sete painéis do Mestre do Sardoal.

Vale a pena efectuar uma paragem no Adro, para uma observação da paisagem envolvente, que do alto da torre sineira teria uma dimensão e abrangência mais latas, um panorama deslumbrante que, em especial, ao pôr-do-sol, convida a reflexões românticas.

Vamos descer para o coração do Sardoal medieval, passando junto à Casa do Adro e à antiga Escola Primária que foi, depois, Casa do Ensaio da Música, em direcção à Igreja da Misericórdia, um templo que começou a ser construído em 1511, no local onde existia uma pequena ermida, que segundo a tradição popular foi mandada construir pela Rainha D. Leonor de Teles, por volta de 1370, numa altura em que acompanhada do Rei D. Fernando, por aqui estanciou.

Para além do portal principal, cuja autoria é atribuída por alguns especialistas ao Mestre Nicolau de Chanterenne ou à sua oficina, cujos sinais de degradação, em especial na pilastra do lado direito, são motivo de profunda preocupação e a que as entidades competentes não têm sabido ou podido acudir, correndo-se o risco de se perder de forma irreversível uma notável obra de arte que, mesmo assim, vale a pena apreciar com atenção. No interior do templo iremos encontrar um interessantíssimo revestimento cerâmico dos finais do século XVII ou do princípio do século XVIII, em que os painéis do Altar-Mór revelam características únicas no Continente Português, uma vez que só nos Açores é possível encontrar azulejos com características semelhantes.

Um pouco abaixo da Igreja da Misericórdia situava-se a primitiva Igreja Matriz da freguesia de S. Mateus, de que em meados do século XVIII ainda existiam vestígios, hoje completamente perdidos.

Deixando o núcleo central da parte velha do Sardoal, descemos à esquerda em direcção ao Chafariz das Três Bicas, cuja nascente segundo a tradição popular, apareceu na ribeira no Terramoto do dia 1 de Novembro de 1755, através de uma fenda, que um frade que no momento por ali passava não deixou fechar, colocando uma pedra que a manteve aberta. Diz também o Povo que quem beber água pela bica do meio, ficará no Sardoal e enfeitiçado pelas suas belezas naturais e humanas…

Pisamos a seguir a Ponte de S. Francisco, que se diz ter sido uma ponte romana, depois demolida e reconstruída e que durante séculos foi a única ponte que assegurava a entrada sul do Sardoal, próxima da Capela de S. Francisco, cujos vestígios desapareceram, sendo a imagem do seu Padroeiro venerada na Capela do Espírito Santo, no centro da Vila.

Subindo a calçada, atravessamos a Estrada do Ramal, seguindo um caminho de terra batida que, em minha opinião faz a transição dos olivais com a floresta, apesar de se verificar, hoje, um curioso fenómeno de natureza botânica que assenta no facto de irmos encontrar muitas oliveiras a «dar» amoras, o resultado visível de um combate desleal entre as silvas e as oliveiras, do qual o homem devia ser o árbitro, função de que se alheou com os maus resultados que vamos ver ao longo de grande parte do percurso.

Atingida a antiga EN 244-3, percorremos algumas dezenas de metros até ao Posto de Combustível da GALP e cruzamos a Variante à EN2, para o que se recomenda muito cuidado e uma atenção redobrada, seguindo a estrada para Valhascos e uns metros depois do Alto da Ramalha, abandonamos o asfalto, seguindo à esquerda, por um caminho rural que nos vai levar ao Ribeiro. No labirinto dos caminhos que vamos seguir devem ser tomadas em atenção as fitas sinalizadoras que vamos encontrar nas proximidades dos cruzamentos. Depois do Ribeiro voltamos a seguir pela esquerda, subindo a encosta do Curral da Serra, pelo limite dos Pombais, até ao Campo da Bola de Valhascos.

Quem, como eu, conhece estes terrenos há cerca de 40 anos, quando não havia uma nesga de terreno por cultivar, uma oliveira abandonada, uma árvore de fruto não tratada, um pé de tojo, de carqueja ou uma moita, não pode deixar de sentir uma profunda tristeza e frustração pela sensação de abandono da terra, que os fluxos migratórios dos anos 60 provocou, apesar de na actualidade se encontrar, aqui e além, alguns espaços cultivados e tratados, ainda que sejam quase exclusivamente os mais velhos, após o seu regresso às origens, que os cuidam, apesar de se ter perdido a exuberância agrícola, e de ser muito reduzida a expressão económica da produção de azeite, de figos ou de vinho.

Esta sensação de abandono faz-me recuar aos tempos da minha infância, quando palmilhava estes olivais, então muito bem tratados, em busca das azeitonas esquecidas, ao “caroço”, ao “aleijo” ou ao “aleijão. Dizia-se “ir ao caroço” à apanha autorizada e legitimada por formas de direito consuetudinário, da azeitona que caía durante o Verão, durante um certo período do mês de Setembro, que creio, terminava a 3 ou 4 de Outubro; “ir ao aleijo” era uma forma que as famílias de menores recursos tinham de conseguir algum azeite, através da apanha das azeitonas que ficavam para trás, depois da passagem do rancho; e “ir ao aleijão”, era uma forma subtil de dizer “roubar azeitona”, em olivais ainda não apanhados, iludindo a apertada vigilância dos seus proprietários.

Cruzando o asfalto, encontramos o Campo da Bola de Valhascos, palco de renhidos encontros de futebol há muitos anos, e que hoje evidencia um abandono similar ao que encontramos nos campos circundantes. Vamos descer pelo caminho da esquerda, onde vai ser necessário procurar com atenção as marcas sinalizadoras do percurso, até avistarmos as primeiras casas do Vale da Pedra, em Cabeça das Mós, abandonando a descida para o Pisão do Bruxo. Seguindo pela esquerda, numa subida acentuada que não é, no entanto, muito longa, fazemos uma caminhada de algumas centenas de metros no espaço urbano de Cabeça das Mós, até ao cruzamento do Vale da Pedra, seguindo depois à esquerda pela rua que vai dar à antiga EN 358 que não chegamos a atingir, porque vamos percorrer um caminho florestal, que começa próximo do Lagar do Alpalhão, seguindo à direita, até atingir uma elevação, onde vale a pena fazer uma pequena paragem, para observar a paisagem envolvente, em especial a Norte, visionando os terríveis efeitos dos fogos florestais e os poucos espaços onde o ordenamento florestal é uma realidade nesta zona.

Descendo à esquerda, encontramos a antiga EN 358 que vamos percorrer num curto espaço, até encontrar a ponte da Ribeira de Arcez, à saída da qual se situa a Casa do Pastor, onde vamos fazer uma paragem para reabastecimento, já que os cerca de sete quilómetros percorridos até aqui já devem ter deixado marcas e desgastado as energias de alguns menos habituados a estas andanças. Vale a pena apreciar a beleza paradisíaca da paisagem envolvente, neste espaço de turismo em espaço rural que o Sr. Carlos Neves e Família em tão boa hora promoveram.

A partir daqui e durante alguns quilómetros o eixo do passeio vai ser a Ribeira de Arcez e depois a Ribeira das Sarnadas, a partir do Vale de Oliveira, num enquadramento bem diferente do passeio que fizemos até aqui. Atravessamos a Quinta de Arcez, seguindo pelo antigo caminho que nos vai levar até à Lapa.

Chegámos à Lapa, onde encontramos na margem direita da ribeira a Ermida da Senhora da Lapa, que mergulha as suas raízes num passado longínquo, de tal modo que a tradição trouxe até nós memórias de lutas com mouros que documentalmente se não podem comprovar.

Seja como for, já por volta de 1600 o seu culto tinha atingido grande difusão. Foi por essa altura que se ergueu a capela em que passou a ser venerada a imagem da Senhora da Lapa, sobre a qual escreveu Frei Agostinho de Santa Maria, em 1721, no «Santuário Mariano», entre outras coisas, o seguinte: “ (…) Junto àquele sítio havia uma quinta de que era senhor o Abade João Cansado e este, por devoção da Senhora, para lhe melhorar o sítio e para não a apartar muito do lugar que escolhera, lhe edificou aquela ermida e santuário, em que a colocou. Infere-se, por tradição, que muitas vezes fugira, para ir buscar o primeiro sítio em que apareceu. Mas depois que de todo se lhe acabou e aparelhou o lugar em que pudesse ser venerada, se lhe pediu com rendido afecto a aceitasse(…).

Qualquer dos caminhos de entrada na Lapa vai dar a pequenos recantos de bucólica meditação e nas árvores são visíveis as marcas de corações feridos pelas setas de Cupido, sinais de fugidias paixões ou de românticos encontros, apenas iluminados pelo luar de prata do mês de Agosto…

A montante da ribeira, a seguir à gruta e às ruínas da antiga habitação e lagar anexo, desenvolve-se, em obra, a construção da Barragem da Lapa, um empreendimento com uma importância estratégica decisiva para o concelho de Sardoal, cuja dimensão pode ser, parcialmente, apreciada por quem não receie subir o paredão em construção. Pena que já não se possa visitar as azenhas da Carrascosa e da Azenha Nova, que por irem ficar submersas foram já demolidas.

A partir daqui entramos no território em que se situam os locais que foram outrora o cenário da minha meninice, que constituíram o mundo dos meus sonhos e que me fizeram vibrar de alegria e de entusiasmos incontidos, na minha alma ingénua de criança. Não resisto à tentação de transcrever um pequeno texto do Professor Bento de Jesus Caraça:

“Morte e vida unem-se, formando um processo único de evolução – o fogo vive a morte do ar e o ar vive a morte do fogo; a água vive a morte da terra e a terra vive a morte da água. Assim a morte não significa destruição, ruína, mas fonte de uma nova vida: a todo o momento a morte actua e a vida surge. Daqui resulta que é impossível, num dado instante, atingir a permanência, a estabilidade seja do que for, tudo flui, tudo devém, a todo o momento, uma coisa nova – tu não podes descer duas vezes o mesmo rio, porque novas águas correm sempre sobre ti.

Mas, se assim é, as coisas, ao mesmo tempo são e não são elas próprias e o mesmo processo de evolução nos atinge a nós – somos e não somos.

Transformamo-nos constantemente.”

Deixamos a Lapa em direcção à Palhota. Passamos pelo Sancho, ao lado de uma ponte que a tradição popular diz ter sido construída pelos Romanos. À nossa direita fica um monte elevado e íngreme, que pelo lado da Lapa termina numa escarpa a pique. Chamam a este monte «Castelo da Lapa» e são ainda visíveis alguns vestígios de construções antigas que se diz serem de uma povoação pré-histórica, mas o assunto nunca foi devidamente estudado para se poder concluir pela verdade ou mentira desta afirmação.

Se subíssemos até ao cume, ganharíamos, a pouco e pouco, a percepção de uma paisagem envolvente, agressiva, caracteristicamente rural, mas de uma beleza que as palavras do nosso vocabulário não podem descrever. Para sul a Lapa e a Quinta de Arcez; para nascente os montes que escondem a aldeia de Entre Serras; e rodando em sentido contrário ao do movimento dos ponteiros do relógio, encontramos a Carrascosa e mais atrás a Azenha Nova, na Ribeira do Vale Formoso. Em baixo corre a Ribeira das Sarnadas ou do Cabril, ao longo do Vale de Oliveira, ficando à nossa esquerda o Porto de Mação, complexo aproveitamento hidráulico que pode manter em funcionamento simultâneo, com uma só levada, duas azenhas e um lagar. Virados para norte e para poente fica o Vale do Sancho, as Pardianas, as encostas dos Bordelhos. Em baixo, aos nossos pés, a Palhota e, mais longe, Entrevinhas.

Chegados ao Largo da Palhota, podemos recordar a espartaria que aí funcionou durante muitos anos e uma história da minha meninice que falava da existência de um túnel que ligava a casa que foi do Ti Zé Cristo à Lapa, através de uma cidade subterrânea em que habitavam mouros. Contava-se, ainda, que um galo introduzido por uma abertura que existe na Lapa, 50 metros abaixo da Capela, tinha vindo cantar debaixo da casa do referido Zé Cristo, sendo recolhido por um alçapão que aí existia. Coisas do imaginário popular…

Aqui passava uma rota de almocreves, que nas suas mulas transportavam mercadorias de terra em terra, que devia vir de Mação, de onde resulta o topónimo «Porto de Mação», porque aí se devia pagar portagem (imposto municipal ou régio) sobre as diversas mercadorias em trânsito. Esta rota seguia para a Venda Nova, Andreus, Bioucas e Tomar ou, em alternativa para o Mogão, Amieira, Codes, Vila de Rei, etc.

Cortamos à direita e poucos metros à frente seguimos à esquerda, até chegar ao Porto de Mação, a que atrás já me referi, onde vamos visitar um moinho movido a água.

Os moinhos movidos a água, nesta região, podem ser de roda horizontal (moinhos de rodízio) ou de roda vertical (azenhas). A diferença entre eles está apenas na parte motora, pois a da moagem é fundamentalmente igual.

O que vamos visitar é um moinho de rodízio.

Do livro “Sistemas Primitivos de Moagem Em Portugal, I – Moinhas de Água e Azenhas”

A água é desviada da ribeira a algumas centenas de metros mais acima, através do açude, um muro erguido na Ribeira das Sarnadas ou do Cabril, para elevar a água para a levada, conduzindo-a para a presa. À entrada da levada existe uma pequena abertura que regula o volume da água que se pretende utilizar, evitando que ela transborde durante o percurso, ou inunde o moinho. A ligação entre a presa e o orifício por onde a água sai para bater nas penas do rodízio é feita através do cubo ou cale.

À entrada dos cubos encontra-se uma espécie de coivo que «filtra» a água e impede a entrada de paus, pinhas, folhas, palhas e outras coisas que possam entupir a seteira de saída da água, onde se situa o pejadouro, que quando é necessário faz o desvio da água evitando que ela bata nas penas do rodízio, parando o moinho. Neste caso o pejadouro está mergulhado a um taco mergulhado na moega.

Do mesmo livro, onde se diz “”no Sardoal encontramos tábuas pregadas a dois braços encurvados, de madeira, que rodam num eixo aplicado na extremidade da cale (fig. 15-i).”

O rodízio é uma peça constituída por uma roda de palhetas nas quais bate o jacto de água, e cujo movimento de rotação é transmitido à mó pela pela que lhe serve de eixo.

A parte da moagem propriamente dita, situa-se no sobrado, onde se encontram as mós, a moega, a quelha e o chamadouro a ela ligados e a agulha do aliviadouro.

As duas pedras designam-se por mós, contudo a inferior é fixa e dá-se-lhe o nome especial de pouso, reservando-se o de , em sentido estrito, ou andadeira, para a superior; o conjunto das duas é vulgarmente conhecido por casal. A mó apresenta na sua face inferior um entalhe de cada lado do olho, formando um encaixe a que se dá o nome de segurelhal, onde entram as abas da segurelha, enfiada na espiga do veio.

A moega é uma caixa de madeira de forma piramidal, com o vértice para baixo a abrir dentro da quelha que é uma caleira de madeira, suspensa da moega e à frente pelo regulador da quelha que é uma peça com que se varia a inclinação da quelha, provocando uma maior ou menor queda de grão no olho da mó.

Do mesmo livro, onde se diz “No Sardoal, o fio passa por um furo no alto da moega, e enrola num pau, o arrocho, que a atravessa de lado a lado (fig. 50-j).”

O chamadouro é uma peça que provoca a vibração da quelha e a consequente queda do grão, sendo o chamadouro que aqui vemos, um chamadouro de rodinha.

O chocalho, a que aqui também se chamava chinquilho, é o acessório que previne o moleiro de que o grão está a acabar na moega. É constituído por um chocalho dependurado de um fio, o qual, depois de passar por uma roldana colocada acima da moega, se vai amarrar a um taco de madeira ou cortiça, metido dentro dela sob o grão. Este taco é coberto pelo grão, e somente quando este está a acabar é que o peso do chocalho o levanta; o chocalho cai então sobre a andadeira, provocando o barulho que previne o moleiro. Pode, também, ligar-se a um taco ou rodela que fica na moega, à tábua do pejadouro. O moinho pára, assim, automaticamente, logo que o grão acabe.

A farinha é recolhida no tremonhado.

E como seria a vida dos moleiros?

Para responder a esta questão, socorro-me do que escreveu Fernando Galhano, no seu livro “Moinhos e Azenhas de Portugal”:

“(…) Acontece muita vez, quando se entra num moinho, ver o moleiro sentado, ou a mexericar em coisa sem importância. Pode-se ficar até com a impressão de que o trabalho mais esforçado, não é propriamente o da moagem, mas o transporte do grão ou da farinha, de e para a casa do freguês.

Vida descansada? É certo, mas nem tanto. É certo que parte do trabalho no moinho é de simples vigilância. Mas, principalmente num dia de vento, ela tem de ser constante e aturada. Uma simples mudança da sua direcção obriga a uma correcção da orientação do mastro; uma ventania mais violenta aconselha a colher as velas. Mas o próprio maquinismo da moagem pede atenção. É o deitar o grão na moega; o ensacar a farinha do tremonhado; um pequeno jeito no aliviadouro, quando o girar da mó não dá boa farinha.

Tarefa mais trabalhosa é o picar das mós. A frequência da picagem depende, evidentemente, da duração do trabalho de moagem e da dureza das pedras. Mas se aquele for constante e rápido, pode a picagem ter de ser feita de três em três dias, e mesmo menos.

Estas são as tarefas normais de um moleiro. Mas há uma peça que se parte, apodrece ou desloca. E há as grandes desgraças de um mastro que se parte, ou de uma levada ou açude que uma cheia destrói.

Claro que, em casos assim sérios, quem os resolve são os especialistas. Mas o moleiro acompanha, vigia, e muitas vezes aconselha. Porque o moleiro é geralmente um homem com habilidade, por vezes mesmo engenhoso, habituado a contar apenas consigo para qualquer compostura, até porque o isolamento do moinho em muitas vezes dificulta a ajuda doutrém.

É talvez o isolamento em que decorre a vida do moleiro que contribui para a sua maneira cordial de receber quem chega. Longe doutra gente durante grande parte do dia (ou durante dias, como é o caso de muitos moleiros alentejanos, cuja habitação se aninha logo por baixo do moinho, no alto de um cerro), é sempre com boa cara que convida a entrar, dá explicações, conversa. Nas minhas andanças, em todas as visitas que fiz a moinhos de água ou de vento (muitas vezes o mesmo moleiro trabalha com o de água enquanto a tem, e com o de vento quando esta falha), nessas visitas nunca encontrei cara carrancuda que me enxotasse.

É certo que os moleiros não têm lá muito boa fama. Mas é por outras razões. Por toda a parte – não só entre nós – os acusaram de fazer a maquia a seu jeito.

Por isso já nos forais se mencionavam as suas obrigações. E desde então não faltaram posturas que regulavam a actividade dos moinhos – a proibição de bestas dentro deles, a obrigação de manterem os cambeiros em ordem, a qualidade da farinha, e, principalmente, a honestidade da maquia. Se essas preocupações foram eficazes, já não será fácil saber. Mas o conhecido dito popular citado por Leite de Vasconcelos, leva a crer bem que não.

Vem minha filha
Tira uma maquia
Vem minha mulher
Tira o que quer
Vem o criado
Tira o que lhe é dado
Venho eu
Tiro o que é meu

Claro que, se fosse assim, não ficava nada para quem lá levava o grão a moer.

De qualquer modo, se em tempos os moleiros foram realmente um tanto ladravazes, hoje já não o são, até porque a concorrência não deixa. Cada vez mais a profissão é difícil, e o número de moinhos abandonados cresce de modo muito rápido. Acontece agora entre nós o que aconteceu lá fora há tempo. Em lugares em que as condições locais não têm animado a instalação de moagem mecânica, eles lá vão mantendo uma vida insegura, enquanto a miragem de melhor paga não afasta deles os profissionais ainda válidos. Muitos são também os que, montando um motor auxiliar, esperam desanimar uma instalação concorrente (principalmente em moinhos de vento do Alentejo).

Balões de oxigénio!

O moinho a água ou a vento pertence a uma época passada; o seu desaparecimento pode apenas olhar-se com certa melancolia.

Em breve, junto dos ribeiros, não restarão senão uns restos de paredes que as cheias do Inverno vão desmoronando aos poucos, E no alto dos outeiros, ou nas terras planas do litoral, o vento, em vez de mover as quatro velas brancas, assobiará apenas nos braços de uma entrosga presa ainda a um mastro partido.”  

Todo este espaço do Porto de Mação, justificava um dia de permanência, para ver com cuidada atenção os pormenores hidráulicos, os mecanismos e artefactos, quer dos moinhos de água, quer do lagar de azeite, que vai ficar parcialmente inundado quando a Barragem da Lapa atingir a sua cota máxima de cheia.

Prosseguimos o passeio atravessando a Ribeira das Sarnadas, pela ponte, cortando depois à esquerda, no princípio do Vale de Oliveira, passando atrás das casas aí existentes e que foram, também, residência de moleiros, seguindo pelo caminho que segue paralelo ao curso da Ribeira.

Não resisto a transcrever aqui um excerto de um poema que escrevi em 1995, com o título “Camponeses Imaginários”:

(…)
Mais tarde, enquanto trato os porcos
E corro à pedrada a galinha pedrês
Que esgaravata os canteiros da couve lombarda
Ouço-te no curral a ralhar com a chiba
Essa danada nova que quer é brincadeira
Enquanto ordenhas as cabras e ovelhas.

Levo uma enxada e vou regar a horta da Ribeira.
A água é de partilhas.
Levo algumas costelas que armo aos pássaros
Com bichos do milho e formigas de asa.
Vou à represa e tiro-lhe o tafulho
E acompanho a água pela levada
Para tapar os buracos das toupeiras
Trago as botas às costas, com as meias dentro
E vou descalço, calças arregaçadas
Usando os calcanhares como maços
Para fechar melhor os cortadouros.
Primeiro rego as couves, com um cabaço
Em corrida agitada para não perder a água.
Depois algumas leiras de feijão de embarrar.
Deixo a água a correr para um lanço de nabos
E regresso à represa para a fechar.
Lavo os pés e volto-me a calçar
Apanho as peras, as maçãs e alguns pêssegos
Que cairam no chão, de ontem para hoje
E alguns melões maduros e melancias
Que guardo no palheiro, p’ra mais tarde levar
Quando aqui vier com o burro com os seirões
Dou a volta às ratoeiras, as tais costelas
Alguns branquinhos, passaretas e ferreiros
Um melro, uma rabeta e duas toutinegras
Que de regresso a casa começo a depenar
(Dos piscos nem sinal, que ainda é cedo)

Vejo o fumo do forno que estás a aquecer
O pão já está tendido no tabuleiro
Fazes o queijo, sentada à lareira
Um ritual sereno que gostas de fazer.
Ajudo-te a meter o pão no forno
E enquanto cose, vamos os dois ao pinhal
Rapar caruma e mato para a cama do gado
Com uma gadanha que eu fiz da ponta de um pinheiro
Recolho as paveias, que juntas com cuidado
E faço os feixes que vamos transportar.
E chegados a casa, tarefas divididas
Tratas do pão e do almoço
Enquanto eu limpo a furda e o curral
Juntando o esterco numa moreia alta
Que irá para a horta na Primavera
Para estrumar as terras
Os porcos assustam-se e ficam inquietos
E só sossegam quando lhe deitas a lavadura
Com o almece, abóbora, algumas couves
E uns figos esmagados
Dois punhados de farinha de milho
Que eu moí na Azenha da Carrascosa
Em pouco tempo o masseirão fica vazio
E os porcos fossam o mato e a caruma
Procurando as minhocas que adoram. (…)”

Antes de cruzarmos a ponte que nos vai levar à outra margem da Ribeira, deixamos à nossa direita as ruínas de uma casa, de um lagar e das azenhas, cujo último moleiro foi o Ti Manuel Fernandes, já falecido e que deixaram de funcionar há cerca de 40 anos. Hoje este conjunto é um monte de ruínas e já nem se consegue notar o sistema de regadio que abastecia as hortas a jusante e cuja partilha de águas assentava em regras seculares, escrupulosamente cumpridas. Formas de direito consuetudinário, que regiam muitas relações entre o povo simples do mundo rural, em que a palavra dada valia uma escritura pública.

Passando a ponte, um pouco adiante, cortamos à direita, deixando à nossa esquerda o marco que separa as freguesias de Sardoal e de Alcaravela. Seguindo ao longo da ribeira, sempre ladeada de amieiros, alguns choupos, salgueiros, eucaliptos e silvas, se procurarmos bem podemos encontrar uma fonte. Basta subir a barreira do lado esquerdo, um pouco antes do primeiro açude. A água é férrea e bebida por um caneco de barro da resina tem um sabor especial e diferente. A brisa que sopra por entre os amieiros e eucaliptos, cria sonoridades próprias que misturadas com o som da água que cai na bica e no açude, nos obriga a uma momentânea paragem, em que podemos procurar identificar as melodias que nos parecem conhecidas. Sem êxito!…

À medida que nos aproximamos do Cabril, as encostas que ladeiam o vale tornam-se mais íngremes e mais altas. Sempre que percorro este caminho, a partir do segundo açude e antes de chegar à primeira azenha, tenho sempre a sensação de que o ar se torna mais quente e o eco dos passos nas duas encostas cria efeitos especiais, que me fazem lembrar o som dos búzios que na minha infância eram utilizados pelos pastores para espantar os lobos ou para anunciar a partida para a faina da apanha da azeitona, nas manhãs frias de Novembro e Dezembro.

Das margens da ribeira sobem montes que no século XVIII se chamavam os Montes da Vilhena, onde se diz ter existido uma povoação pré-histórica e que são o cenário de lendas de mouras encantadas, que podem ser lidas no livro do Dr. Augusto Serras “ALCARAVELA – Memórias de um Povo”, editado há alguns anos pela Câmara Municipal de Sardoal.

Um pouco acima da primeira azenha, encontramos umas ruínas de um lagar. Infelizmente ardeu em 1991, perdendo-se um notável exemplar de arqueologia industrial. Ainda me lembro de o ver a funcionar, há perto de quarenta anos. Era um lagar de vara, com duas varas de grandes dimensões. Enquanto elas existiram, sempre que aqui vinha, a primeira sensação que tinha ao olhar as varas era de admiração. A sua enorme dimensão levava-me a imaginar o esforço titânico que deve ter sido preciso desenvolver para as colocar neste local e a arte e o engenho do artista-carpinteiro que talhou o fuso e montou as engrenagens, com a madeira como principal componente.

A algumas dezenas de metros acima paramos sobre a fraga de onde nasce a Fonte da Rosa Mana. É um local muito bonito. Olhando a ribeira, acompanhem com a vista o monte fronteiro. No alto estão as ruínas de mais um moinho de vento, o último que me lembro de ter visto a funcionar no concelho de Sardoal.

Um pouco antes da ponte, já com as primeiras casas da aldeia da Presa à vista, encontramos o espelho de água da Rosa Mana. Descemos pelo caminho, um estreito carreiro, que passa junto aos moinhos de água, que se tudo correr de acordo com o previsto serão recuperados e postos a funcionar no próximo ano, por iniciativa da Câmara Municipal de Sardoal, e vamos mitigar a nossa sede da bica da fonte da Rosa Mana.

Voltemos agora um pouco para trás, pelo mesmo caminho que seguimos antes, até encontrar o primeiro caminho que nos aparece do lado direito.

Não posso deixar de recordar a Ti Maria Silva, pastora de um pequeno rebanho, que encontrava muitas vezes na minha meninice ao longo da Ribeira do Cabril e na horta do Valinho, ali perto. De recordação em recordação, lembro-me do tempo em que os moradores da Presa iam buscar água para beber à Fonte da Rosa Mana. Era um longo percurso para ter água potável, para ter um cântaro ou asado na cantareira, peça de mobiliário, caída aos poucos em desuso, onde se colocavam também os pratos.

Vivendo um pouco de recordações, e olhando as lameiras das margens da ribeira, lembro-me de uma cultura que teve grande tradição nas hortas deste vale: Refiro-me ao linho.

Na freguesia de Alcaravela, a existência de uma povoação chamada Pisão (para quem não saiba, direi que o pisão era um dispositivo movido a água para trabalhar o linho), é indício seguro de que o linho também teve aqui grande importância na manufactura de vestes, toalhas e lençóis.

Vocábulos como: ripanço, bagunha, maço, tasca, espadela, cedeiro, roca, dobadoira, argadilho, são exemplos de uma linguagem ancestral, hoje quase perdida.

Percorrendo o caminho a meia encosta, no Valinho, as minhas memórias perdem, de repente, o rosto. Pasta de suor e névoa, labirinto escuro na claridade do dia que só começa a iluminar-se ao sol posto. De um momento para o outro sinto na mão que me guia a cegueira ardente dos olhos da imaginação…

Julgo ver os camponeses a erguer a enxada e enterrá-la com força de coveiro, desfazendo os torrões para não pesarem nas sementes e quando páram, olhando o céu, como se tivessem o culto das nuvens. Apetece-me perguntar-lhes pela chuva, porque acredito na cerimónia das sementes, quando interrogam as árvores para que possa haver flores e frutos. Afinal, basta uma semente para que tudo possa voltar ao sonho…

A terra ama todos os mortos com os mesmos embalos de flores e chuva e a intimidade do silêncio que apodrece as raízes, esconde nas sementes as flores com punhais de Primavera.

Percorri este espaço muitas vezes, de noite e de dia, porque gostava de respirar a brisa, o suor, a noite, obrigando as rãs a calarem-se nos charcos, porque gosto de sonhar em silêncio. Mas, agora, a força húmida do sol rompe pequenas membranas no sexo dos pinheiros. Atrás de nós, eucaliptos em fila, neste cemitério de árvores, tão frágeis quando os ramos se curvam. Mais acima, olhando o manto verde pinho que se estende em todas as direcções, até os olhos constroem as chamas na morte dos pinheiros. Há o rigor da cor da sede e aqui, neste monte de poente-lume-roxo, quero sentar-me a ver as formigas na terra.

Prosseguimos por entre moitas, tojos, carquejas e estevas e ao olhar a paisagem deslumbrante em todas as direcções, quero supôr, aqui, um epitáfio: “Não há vida nem morte, mas apenas um conjunto de sonhos: futuro, presente, passado. A angústia de, mesmo sem começar, tudo ter acabado há muito.”

Um pouco à frente, seguindo pela esquerda, o monte e os pinheiros impedem a visão do que vou descrever:

“Na linha fronteiriça do horizonte, uma crista de moinhos de vento, limita o território dos homens.

As suas velas descrevem uma dança ritual entre a terra e o céu, com corvos por testemunhas.

Por aqui passaram Romanos, Visigodos e Árabes, neste punhado de terra fecundado pela espiritualidade, semeado de sol e de flores e de gente boa, onde não há semente que não se transforme na fruta mais colorida ou no trigo mais louro; não há céu mais macio, nem luz mais acariciante para as mil flores que Deus aqui deixou para desafiar os artistas…

Os que partiram para longe guardaram esta terra agarrada à sola dos sapatos e a saudade cravada na alma… No coração, tradições, festas e rituais que pontuavam o ritmo das estações, das colheitas, das ceifas, das vindimas… Na pele, uma cultura.

Ribeiros e riachos emitem música para inspirar os poetas e um firmamento límpido, resguarda luminosos segredos de beleza para quem os queira ver. E, de repente, o milagre da Criação está aí, óbvio, oferecido à nossa contemplação, exibindo a sua beleza com toda a espontaneidade. De repente, abre-se na nossa memória aquele livro de imagens, cheio de emoções estéticas que dormitavam e que situamos lá muito perto do paraíso, onde giestas e rosmaninho abundam.”

Andando algumas centenas de metros, seguimos por um caminho à esquerda que nos vai levar aos Moinhos de Vento de Entrevinhas. Basta seguir as marcas indicativas colocadas nos pinheiros.

Recomendo um texto que escrevi há algum tempo, com o título: “Os caminhos da modernidade. Tão longe e… tão perto!”, com algumas memórias e testemunhos deste espaço e da sua ruralidade, ainda tão presentes na minha memória.

Sempre que regresso ao Alto dos Moinhos de Entrevinhas, percorre-me um frémito de emoção, como se fosse possível viajar no tempo e recuar mais de quatro dezenas de anos, quando ainda funcionava o moinho que agora, se o vento o permitir, volta a funcionar, quando o seu moleiro era o Sr. Joaquim dos Santos Baptista ou o seu filho Tiago, que também eram os donos da azenha que visitámos no Porto de Mação.

Nasci a pouco mais de trezentos metros daqui. Por aqui cresci, brinquei e trabalhei. Aliás, era aqui que nos finais dos anos cinquenta se juntavam os rapazes da aldeia de Entrevinhas para disputar renhidos desafios de futebol com bolas de trapos, descalços, para não estragar os sapatos e em quase sempre acabávamos com os dedos dos pés esfolados e/ou com grandes nódoas negras. Era também aqui que se vinha buscar uma espécie de argila amarelada (ocre) que misturada com a cal servia para pintar as barras das casas.

Creio que não vale a pena descrever a paisagem envolvente. Basta que a olhem com atenção. E ainda que a altura dos primeiros pinheiros impeça uma maior abrangência do horizonte que se abre, especialmente a sul e a poente, podemos ver algumas casas de Cabeça das Mós e de Mouriscas, a Vila do Sardoal e algumas casas de Carvalhal e se a limpidez da atmosfera o permitir, a cidade de Abrantes, que invejosa nos esconde as planuras da Lezíria Ribatejana e na direcção das torres da Central Termoeléctrica do Pego, um elemento estranho à paisagem que simboliza, para o bem e para o mal, a evolução tecnológica na produção de energia eléctrica, as planuras alentejanas, onde tantos homens da aldeia de Entrevinhas e de todo o concelho de Sardoal, no papel de «ratinhos», labutaram em longas jornadas de ceifas, trabalho e sofrimento. Para norte e nascente as agrestes serranias, que a pouco e pouco se voltam a vestir de verde, depois de percorridas por uma língua vermelha de fogo, nos escondem a Beira Baixa, cujas características já são evidentes na vizinha freguesia de Alcaravela, cujos limites daqui se avistam.

O nosso passeio está quase a terminar. Descendo para a aldeia de Entrevinhas, seguindo ainda as marcas sinalizadoras, estará, assim o espero, à nossa espera, no Largo das Festas, bem próximo da Capela de Santo António de Entrevinhas, um autocarro que nos transportará para o Sardoal, onde vamos ainda fazer um curto itinerário urbano que começará no Jardim da Tapada da Torre, passando pelo Eucalipto Grande, uma das árvores notáveis e classificadas do concelho de Sardoal. As outras são a Pinheira do Castiço, junto da qual passámos perto no princípio do passeio, o Sobreiro de Dona Maria, nos subúrbios da Vila, logo a seguir à Fonte Velha e a Palmeira da Casa Grande, sentinela vigilante, há muitos anos, que sobressai sobre os telhados, nas traseiras dos Paços do Concelho e da Casa Grande, bem no coração deste burgo.

Vamos passar pelo antigo Convento de Santa Maria da Caridade, fundado em 1571 pelos Franciscanos da Província da Piedade, onde em imponente mausoléu repousa D. Gaspar Barata de Mendonça, um sardoalense ilustre, que foi o 1º Arcebispo da Baía e Primaz do Brasil, que em finais do século XVIII reedificou o Convento.

Com a extinção das Ordens Religiosas, em 1834, foi para aqui transferido o Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Sardoal, entretanto encerrado, em 1979. Em espaço anexo funciona o Lar/Centro de Dia de Santa Maria da Caridade.

Voltando a descer, por entre os seculares freixos que a tradição popular diz terem sido trazidos da Índia, na segunda viagem de Vasco da Gama, passamos pela Capela de Sant’Ana, onde se venera com devoção, em especial das mulheres grávidas, uma imagem tripla com a Padroeira que segura ao colo a Virgem, que por sua vez segura o Menino Jesus.

Continuando pela Rua 5 de Outubro, passamos pela Capela de Santa Catarina e pela Capela de Nossa Senhora do Carmo, que era a Capela privativa da Casa Grande ou dos Almeidas e eis-nos chegados ao ponto de partida.

Apesar do cansaço, espero, sinceramente que tenham gostado deste percurso, um, entre muitos que seria possível fazer, com inegáveis motivos de interesse, pelo concelho de Sardoal.

Vivam as Festas do Concelho e aceitem o nosso conselho: voltem sempre!

23 de Setembro de 2000

Valhascos – Contributo para a sua História

Em Julho de 1940, no Jornal Ilustrado “A Hora” dizia-se sobre os Valhascos:

É a mais rica e produtiva de todas as aldeias do Concelho. O seu solo não tem igual porque dele se extrai de tudo em abundância: azeite, fruta, cereais, etc. Não estaremos muito longe da verdade se afirmarmos que esta aldeia é a mais industrial e laboriosa. Com os seus trezentos e tal fogos, vivendo já religiosamente separada da freguesia-mãe, aspira, agora, como noutro lugar afirmamos, a emancipar-se sob o ponto de vista administrativo. Isto é, aspira a transformar-se numa freguesia, tendo já enviado, neste sentido, uma petição a S. Exª o Sr. Ministro do Interior e cujo deferimento o povo de Valhascos aguarda com ansiedade. Nada lhe falta: tem boas fontes, duas óptimas escolas, uma esplêndida estrada e uma cabine telefónica.

Este documento que se apresenta faz uma recolha de diversos elementos para a história dos Valhascos.

Cabeça das Mós: entre castelos e moinhos de vento

Situada a nascente da Vila de Sardoal, a cerca de 3 km, a aldeia de Cabeça das Mós estende-se por uma considerável superfície, distribuindo-se por diversos núcleos populacionais de curiosas e características designações toponímicas: a Estrada, as Lameiras, as Almoinhas, o Monte, o Vale de Enxame, as Lojas (Largo do Comércio), as Casas Crespas, as Casas Louras, o Casal da Cordeira, o Colmeal, a Portela, o Vale da Pedra, o Vale das Figueiras, entre outras.

A designação toponímica Cabeça das Mós não deve ser muito antiga, porque apenas a partir de meados do século XVII se começam a encontrar-lhe referências escritas.

Creem alguns que a sua origem tenha sido em torno da pedreira que existiu no Colmeal, de onde se extraíram pedras para muitas mós e construções. Como nota curiosa, recordo um passo do manuscrito «Memórias restauradas do antigo lugar e Vila de Sardoal», de Jacinto Serrão da Mota, sardoalense que as escreveu por volta de 1750, e que se conservam no Arquivo Municipal de Sardoal: «No ano de 1552, entrando Gil Vaz, cavaleiro, por Provedor e Rodrigo de Parada, por Escrivão, mandaram fazer o páteo na forma que hoje se acham e custaram 17 000 réis, sendo os oficiais desta vila e a pedra de Cabeça das Mós, termo dela.” – escrevia o autor sobre a construção da Igreja da Misericórdia de Sardoal.

A alguma distância da aldeia, abaixo do Vale da Pedra e na direcção de onde sopra o vento suão, nos Castelos, existem vestígios que atestam a vida do homem para lá da história. Por ali se exploraram minas de que o Dr. Giraldo Costa no seu «Esboço Corográfico da Vila de Sardoal – 1882», diz o seguinte: «Aquela que pareceu dar produto, próximo à aldeia da Cabeça das Mós, no sítio denominado o Castelo, está desde há muitos anos abandonada, não se sabe bem porque motivo e passada ao domínio do Estado, pela falta de renovação dos manifestos.». Também o General Carlos Ribeiro escreveu, em meados do século passado, uma curiosa memória sobre uma mina de chumbo na Ribeira das Caldeiras, que não transcrevo neste local, por ser muito extensa e de carácter eminentemente técnico.

Creem outros que na zona dos Castelos tenha existido uma povoação galo-celta, de que se diz terem sido encontrados vestígios. Querem alguns, ainda, que ali tenha sido a cidade de Tubuci, que aparece associada ao nome de Abrantes e consta ter sido a designação que lhe deram os romanos.

Na obra manuscrita de Jacinto Serrão da Mota, consta uma nota muito interessante sobre o Castelo de Arecez que não resisto a transcrever:

“No ano de 1775 tornei a calcular ou a apegar as ruínas do Castel de Arecez e achei o seu âmbito ainda maior, calculando que levaria dentro de seus muros de que só se veem vestígios e ruínas, que em toda a parte os têm demolido e posto por terra, de que apenas em parte se veem com alguma formalidade de muros nas escarpas e achei que dentro deles se poderia semear um bom moio de pão.
Reparei como ali se poderia conservar povoação tão dilatada sem vestígio algum de fonte por aquela redondeza do monte: porém vi que tudo entupiria o tempo com as ruínas. De que esta povoação de que não temos nome seria na antiga Lusitânia e um dos povos Tubucenses, a razão não o mostra por não distar mais de uma légua da antiga Tubuci, Abrantes.
Tendo, porém, discorrido não se poder alcançar pela História, nem pela tradição se foi fundação de Cartagineses, Romanos, Godos, nem Árabes, supondo-a mais antiga e acho opinião favorável de que os Godos a destruíram. Dou a razão e mostro a opinião:
Havemos de fazer esta reflexão que depois da invasão dos bárbaros nas Hespanhas e da porta destas em que El-Rei D. Rodrigo, último dos primeiros Godos, se continuava no Infante Pelayo, Duque da Cantábria, a linha dos segundos Godos. Este Infante Pelayo morrendo, ficou sua filha Hermesinda detentora de todas as suas possessões que seu pai havia ganhado aos Mouros, ajudado de alguns senhores e gentes, relíquias que ficaram dos antigos e primeiros Godos. Entre estes senhores foi um deles D. Afonso, descendente de Recarredo e filho de Leogivildo que gozava muitos estados com o título de Duque. Este D. Afonso teve grande parte nas vitórias de El-rei Pelayo, adiantando seus estados, estando a seu lado em todas as batalhas contra os infiéis, a quem despossuiu de todas as que lhe restava na Galiza, Astúrias e Biscaia.
Esteve casado Afonso, pelos anos 739, no 8º século, com a Infanta Hermezinda, filha de D. Pelayo e se chamou Afonso I, apelidando-o o povo com o nome de Católico, pelo muito que o mostrou ser no culto da Religião entre bárbaros.
Deste nasceu D. Truillo ou Truela, de quem foi único herdeiro o 2º Afonso, chamado o Casto, que libertou a hespanha do vil tributo das cem donzelas que o seu irmão bastardo havia celebrado com o Rei Mouro de Córdova, o qual ofendido de Afonso lhe negar o contrato e o tributo, entrou pelas suas terras com um exército formidável e lhe fez suas hostilidades, não se livrando de receber outras maiores.
No século 8º e pelos anos de 791 até 821 os empenhou numa acção decisiva, em que lhes matou 5 000 homens em Lugo, na Galiza e os seguiu desde ali até às margens do Tejo, retirando-os e carregando-os até Lisboa, tirando-lhes todas as praças fortes que a destra sinistra encontrava no caminho.
Eu não terei a leveza de o jurar, mas a liberdade de opinião é que nesta revolta acabou aquela forte praça em vizinhança de Abrantes. Esta liberdade não se me pode impedir. As histórias daquele tempo não nos oferecem outras clarezar: os soldados eram mais que os escritores; grandes memórias se não concederam à nossa notícia!
Esta povoação, segundo a sua grandeza não poderia ser sem nome e este nem nos duvidosos treslados da tradição se nos consta. É certo que os habitantes por aqui haviam de ter suas fazendas, assim como hoje as temos por ali. O que não consumisse a guerra para as suas vizinhanças, os havia de atrair a criação e amor da pátria, a naturalidade. Cada um conjecture como lhe parecer. Eu tenho disso a minha conjectura.
Já se disse que na Lapa, Montes da Vilhena e Sobral há vestígios de povoações antigas. Todas estas são mais vizinhas a esta Vila e poderão ser já dela. Eu nada afirmo sem prova que me favoreça e esta não era mais do que a conjectura referida que não é sem verosimilhança.”

Tudo isto são suposições que não puderam ser confirmadas e só a título de curiosidade aqui as deixo. É facto que a tradição trouxe até nós lendas de mouras encantadas e é assaz curiosa a lenda do Poço das Caldeiras, cuja recolha deveria ser feita com o rigor possível.

A Ribeira das Caldeiras que desliza ao encontro do Tejo sobre um leito sinuoso, com margens de exuberante vegetação e frescura é a continuação da Ribeira de Arcez, que vem da Lapa, um pouco acima da qual se dá a confluência das duas ribeiras que lhe dão origem e que têm as suas nascentes na freguesia de Alcaravela, uma um pouco acima da Saramaga e que passa pelo Pisão e Vale Formoso, a caminho da Carrascosa, onde se dá a confluência com a outra que nasce um pouco acima de Santa Clara, passando pela Rosa Mana, Cabril, Vale de Oliveira, Porto de Mação, também a caminho da Carrascosa.

Um pouco abaixo da Carrascosa, equidistante de Cabeça das Mós, de Entre Serras e da Palhota, fica a Lapa, local paradisíaco, onde se situa na margem direita da ribeira a Capela de Nossa Senhora da Lapa, que mergulha as suas raízes num passado longínquo, de tal modo que a tradição trouxe até nós memórias de lutas com mouros, que documentalmente se não podem comprovar.

Seja como for, já por volta de 1600 o seu culto tinha atingido grande difusão. Foi por essa altura que se erigiu a igreja em que passou a ser venerada a Imagem de Nossa Senhora da Lapa. Da história deste Santuário dou nota em trabalho anexo.

Qualquer dos caminhos de entrada na Lapa vão dar a pequenos recantos de bucólica meditação e nas árvores são visíveis as marcas de corações feridos pela seta de Cupido, sinais de fugidias paixões ou de românticos encontros, apenas iluminados pelo luar de prata do mês de Agosto, em que também se encontram furtivos pescadores de enguias e as que ficam, não mais regressam ao Mar dos Sargaços, antes enriquecem saborosos ensopados, de que o autor destas linhas, modéstia à parte, se considera exímio executante.

ALGUMAS NOTÍCIAS SOBRE A FESTA DO SENHOR JESUS DA BOA MORTE  EM CABEÇA DAS MÓS E OUTRAS CURIOSIDADES

A notícia mais antiga que conheço sobre a Festa do Senhor Jesus da Boa Morte, em Cabeça das Mós, consta do Jornal “ECHO DO TEJO” que se publicou em Abrantes no princípio do século, e data de 4 de Maio de 1902:

No dia 6 do passado mês de Abril, Domingo de Pascoela, foi a festa da Cabeça das Mós que este ano excedeu em brilho os limites do costume.
Foi abrilhantada pela velha e popular Filarmónica desta Vila, que ali foi desempenhar muitas e variadas peças do seu reportório.
O senhor Simões que é quem dirige esta Filarmónica composta por rapazes de boa vontade, muito concorreu, também, para o maior brilho daquela festa pois forneceu grande quantidade de bandeiras para adornar o adro da Capela.
“Nunca na Cabeça das Mós se viu uma festa assim!”, era o que todos diziam.
Ninguém quis ficar em casa na tarde desse dia. Todos os habitantes daquela aldeia, velhos e novos, saíram das suas casas para virem presenciar o espectáculo que oferecia o adro da Capela. A mocidade folgava por ver o arraial com uma animação desusada e poder dar maior alegria à sua expansão juvenil.
Os velhos e aqueles a quem os anos e as lutas da vida já trouxeram reflexão, deixavam transparecer na fisionomia uma tal ou qual admiração.
Todos, enfim, se julgavam agradecidos ao Sr. Simões que foi decerto a alma de tanto entusiasmo.
Nós pela nossa parte aqui deixamos consignados os nossos parabéns ao Sr. Simões pela sua boa vontade em ser útil a esta Vila e pela vida e animação que imprime a qualquer acto em que toma parte.
Bem haja ele pelo o muito que está fazendo a favor desta Vila.”

No Jornal “NOVIDADES” de 30 de Abril de 1925, publica-se a seguinte notícia:

“Realizou-se no passado domingo, dia 19, na aldeia de Cabeça das Mós, a tradicional festa em honra do Senhor Jesus da Boa Morte.
Constou de missa cantada e sermão que foi pregado pelo Revº Padre Francisco Pires, mui digno Prior de Alcaravela.
Foi grande a afluência dos fiéis e mais seria se não fosse o tempo chuvoso.
No dia seguinte houve missa, tendo comungado bastantes pessoas.”

Ainda que não relacionada com a Festa do Senhor Jesus da Boa Morte, transcrevo uma outra notícia publicada no “NOVIDADES” em 9 de Junho de 1926:

“Vão bastante adiantadas as obras de construção da Igreja da vizinha aldeia de Cabeça das Mós. Espera-se que as obras estejam concluídas para a Páscoa do próximo ano.
Era esta obra necessitada porque a Igreja que estava demasiado pequena e não chegava para comportar os fiéis deste numeroso povo.”

No “NOVIDADES” de 30 de Junho de 1927:

“Cabeça das Mós – Viagem Eucarística à Senhora da Lapa.
Como tínhamos anunciado, realizou-se no passado dia de S.João a viagem eucarística à Senhora da Lapa. A afluência foi extraordinariamente superior aos outros anos, calculando-se em cerca de 3 000 o número de peregrinos que nela tomaram parte.
A festa que nesse mesmo dia se fez em honra de Nossa Senhora da Lapa, constou de missa campal, comunhão geral e sermão.
Como era lindo ver aquele grande número de cabeças prostrado ante JESUS SACRAMENTADO, enquanto uma grande parte com recolhimento e fervor se abeirava da Sagrada Mesa.
À tarde depois de cada um ter refeito as suas forças com os seus farnéis, houve terço, ladaínhas, cânticos e sermão.
O orador da manhã foi o Revº Prior de Alcaravela e de tarde o Revº Padre Ventura, zeloso Vigário do Mação.
Acompanhados dos respectivos Párocos incorporaram-se no préstito as freguesias de Abrantes, Sardoal, Mação, Alcaravela, Queixoperra, Mouriscas e Mógão.
À despedida houve troca de discursos muito efectuosos, tendo-se salientado a nota da estreita união e obediência ao nosso venerando Episcopado para a eficaz reivindicação das liberdades católicas.
Todos os peregrinos retiraram muito bem impressionados, entoando cânticos ao SENHOR e à SANTÍSSIMA VIRGEM.”

No mesmo Jornal:

Em 27 de Janeiro de 1929:

“Até que enfim, já reabriu a Escola de Cabeça das Mós, tendo sido nela colocada a Srª D. Maria do Carmo Leitão.”

Em 29 de Maio de 1930:

“Mediante concurso, tomou ontem posse do lugar de professora efectiva da Escola do Sexo Masculino de Cabeça das Mós, a Srª D. Maria Previdência Lucas.
Por esse motivo retira por estes dias a Srª Professora interina que aqui se encontrava, a D. Maria José.
Esta Senhora deixa em toda a população grandes saudades, pelo seu fino trato, tanto para os grandes, como para os pequenos.”

No “JORNAL DE ABRANTES”, de 28 de Agosto de 1932:

“No dia 14 do corrente foram inauguradas na aldeia de Cabeça das Mós, três fontes que a Câmara deste concelho, auxiliada por um grupo de naturais daquela localidade, ali mandou construir.
Usaram da palavra diversos oradores que enalteceram as qualidades da digna vereação municipal deste concelho.”

No Jornal “NOVIDADES”:

14 de Abril de 1933:

“Consta-nos que no próximo mês de Maio vão começar os trabalhos de montagem do telefone para Cabeça das Mós e S. Domingos. São melhoramentos de grande valia e utilidade.”

29 de Abril de 1933:

“Já se encontram efectuados os trabalhos de terraplanagem da estrada de Cabeça das Mós-Arcês. O povo da Cabeça das Mós mostra-se satisfeito pela realização desta velha aspiração que traz importantes vantagens para o povo desta fértil região.”

3 de Junho de 1933:

“Está já completa a terraplanagem da estrada Sardoal – Cabeça das Mós – Arcês. Por esse motivo tem sido grande o movimento de automóveis, camionetas e diversos veículos, pela Cabeça das Mós.”

22 de Julho de 1933:

“Causou aqui grande agrado o decreto inserido na folha oficial que manda que seja dado o nome do Padre Manuel Lopes Alpalhão à escola de Cabeça das Mós, que aquele belo sacerdote ofereceu à sua terra natal, bem como uma casa contígua para o professor.
Bem haja o Governo por tal resolução e ao povo de Cabeça das Mós que pediu para o benemérito sacerdote tal homenagem, depois de lhe ter manifestado o seu reconhecimento bem sincero por ocasião do descerramento do seu retrato na sala de aulas.”

9 de Setembro de 1933:

“Em passeio com alguns amigos tivemos há dias o ensejo de admirar o «Poço das Talhas», situado ao sul da Cabeça das Mós, na ribeira de Arcês, no fundo de um monte onde, segundo dizem, estiveram outrora situados castelos mouriscos.
Perto fica a «Raposeira».
É realmente de admirar este poço singular. Sendo no interior do feitio de uma talha colossal e extremamente perfeita, apesar da dureza dos rochedos onde está situada. Junto vêem-se outras talhas, sem água, que primam também pela perfeição.
Calcula-se que a maior tenha uma capacidade de 10 000 litros. A este poço andam ligadas lendas, interessantes, de mouras encantadas.
No fundo, diz ainda a lenda, encontra-se depositada uma grade de ouro puro, que por enquanto está por desencantar.
Devido às intempéries do tempo, restam fracos vestígios dos altos castelos mouriscos. Só tijolos e pedras dispersas pelo chão indicam o provável ponto em que estavam situados para dominar os montes em redor.”

“JORNAL DE ABRANTES” – 25 de Março de 1934:

“ Acaba de ser concedida a comparticipação do Estado de esc: 29.454$71 para o empedramento da estrada municipal de Sardoal a Arcês, entre esta Vila e Cabeça das Mós.
Sardoal, conseguindo mais este valioso auxílio continua suprindo as suas principais necessidades de uma maneira digna de todo o elogio, mercê da honesta e criteriosa acção da Comissão Administrativa dos principais valores do Concelho desde a Política do Estado Novo.
Sardoal que antes do 28 de Maio era um concelho quasi abandonado e desprovido dos mais rudimentares melhoramentos, impõe-se hoje servindo de modelo. Todos os lovores merecem, pois, as pessoas que com o seu esforço e boa vontade deram ao progresso concelhio o bem estar e harmonia que presentemente usufrui.
O Jornal de Abrantes, modesto semanário regionalista – defensor do Estado Novo, ao qual não são indiferentes quaisquer manifestações de vitalidade na região- congratula-se por poder prestar justiça à gente do Sardoal que tanto zelo tem posto ao serviço do progresso do concelho.”

Jornal “ NOVIDADES” – 30 de Julho de 1938

“SARDOAL, 25

JORNADA EUCARÍSTICA

Celebrou-se ontem no aprazível local da Lapa, subúrbios desta vila, uma festa de piedade.
Por volta das 11 horas, havia já milhares de pessoas de todas as condições sociais na ribeira de Arcês, em frente da antiga e histórica capelinha de Nossa Senhora da Lapa.
Imponente de majestade e beleza foi a entrada do povo das freguesias de Mouriscas, Sardoal e Alcaravela, com as crianças da catequese, filhas de Maria, Cruzada Eucarística, rapazes e raparigas da Acção Católica, dirigido pelos seus respectivos párocos.
As bandeiras das diferentes associações drapejando no ar, o cântico cheio de melodia que os romeiros cantavam em honra de Nossa Senhora, o local aprazível e próprio para a oração, formavam um conjunto magnífico, que encantava e aquecia as almas.
Principia a missa cantada, oficiada pelo revº Prior de Alcaravela, acolitado pelos Padres Roldão e Milheiriço.
A missa de Angelis dirigida pelos Padres Matos e Marujo e cantada pelo povo, centenas de vozes, ecoava nas quebradas.
Ao Evangelho, o pároco de Mouriscas fala da devoção dos portugueses a Nossa Senhora, incitando os presentes a confiar no seu poderoso patrocínio para as horas amargas dos nossos dias.
Ao Comunio 1 400 pessoas receberam Jesus Hostia, enquanto o povo canta hinos apropriados ao momento solene que se passa.
Depois de um intervalo para tomar algum alimento, aquela enorme multidão, rezou o terço meditado, seguindo-se uma sessão solene de propaganda da Acção Católica.
Em frente da capela, num estrado previamente preparado tomaram lugar as Sras. D. Clara Geirinhas, D. Delfina lalanda e D. Maria do Carmo, respectivamente professoras em Mouriscas, Alcaravela e Sardoal – Cabeça das Mós e o sr. Dr. João Calado Rodrigues, advogado em Mação e Director da Revista “Terras do Tejo”.
O Sr. Arcipreste do Sardoal que preside, secretariado pelos Revºs Pires e Roldão, convida a professora Srª D. Maria do Carmo a usar da palavra. A oradora falou da mulher como apóstola em todos os tempos, para concluir que as mulheres católicas de hoje, sobretudo as de Portugal, não devem ficar atrás das de ontem e por isso convida as mães e as filhas que a escutam a dar um passo em frente, acudindo ao chamamento da Igreja que as convida a trabalhar na recristianização da nossa querida Pátria.
Fartas palmas coroam o final de tão substanciosa lição.
Em seguida falou a srª D. Clara Geirinhas que focou o bem que adveio à humanidade da vinda de Jesus ao mundo, que a felicidade deste só pode provir da doutrina de Cristo vivida, e por consequência da reconquista das almas para Jesus, com a vinda de Jesus às almas para pôr termo aos males presentes.
Uma manifestação calorosa, principalmente das raparigas de Mouriscas. Coroou as suas últimas palavras.
A srª Delfina Lalanda convidou as raparigas presentes a ingressar de facto na Acção Católica, prégando, principalmente com o seu cristão exemplo, no modo de vestir, de falar e de viver na sociedade.
Diz que a mulher dignificada pela religião cristã, só pela prática das virtudes que ela inculca pode continuar na elevada situação a que o cristianismo a elevou e evitar a desgraça a que o comunismo procura degradá-las. Palmas e vivas estrondosos.
Dada a palavra ao sr. Dr. João Calado Rodrigues, principia por agradecer a honra que lhe concederam para falar nesta sessão. Lendo e comentando um página sublime do seu livro de versos em preparação «Jesus nos Evangelhos» dá uma magnífica lição ao povo que ali se encontrava. Dirige-se depois às crianças que em grande número o ouviam, incita os pais e os mestres a cuidar com todo o desvelo das suas almas, pois as crianças são verdadeiramente o encanto de Jesus.
Fechou a série de discursos o Presidente para agradecer a gentileza dos oradores. Focou as partes mais importantes de cada um dos discursos, louvando a coragem, a disciplina católica e o amor a Jesus que acabavam de manifestar.
Convida os ouvintes a imitar os oradores na sua fé, na sua coragem e na sua disciplina e com calorosos vivas a Cristo Rei, Sua Santidade o Papa, Prelado da Diocese e Católicos presentes, deu por terminada aquela linda e oportuna festa.
Encontravam-se também presentes um núcleo importante de católicos da Vila de mação e bastante povo das freguesias de Souto, Abrantes e Mouriscas.
Também as sras. Proprietárias da capela, Matos e Silva de Vila de Rei, que sempre ao serviço de Deus e das almas não se poupam a sacrifícios, quiseram tomar parte na nossa tão linda festa, pelo que aqui lhe endereçamos os nossos melhores agradecimentos.

Jornal “NOVIDADES”:

 15 de Fevereiro de 1940

“Projecta-se a construção de um cemitério entre Cabeça das Mós e Entrevinhas, para o qual o Estado já contribuiu com 5 000$00.”

Num suplemento do Jornal Ilustrado Português “A HORA”, dedicado ao Concelho de Sardoal, publicado em Julho de 1940, vem a seguinte nota sobre Cabeça das Mós:

“A dois quilómetros da Vila, entre oliveiras e árvores de fruto, encontra-se a povoação de Cabeça das Mós com as suas casinhas brancas a denunciar asseio tanto exterior como interiormente. Como ainda não tem, como outras localidades do concelho, edifício escolar próprio, pois que as escolas funcionam na casa oferecida pelo benemérito Rev. Padre Alpalhão, a quem a aldeia muito deve. As suas principais aspirações são:
Construção de uma escola, uma fonte e um cemitério, para o qual já há comparticipação do Estado e será começado no próximo ano e instalação dum posto telefónico.
Tem alguns locais que são dos mais pitorescos de todo o concelho, tais como:
A Ribeira de Arcez e a Capela da Senhora da Lapa. Produz principalmente azeite, cereais e frutos.

23 de Abril de 1945

“Reina grande entusiasmo na florescente aldeia de Cabeça das Mós pela instalação da nova escola. O povo vai contribuir para a sua construção.”

27 de Abril de 1945

“Estão constituídas as Comissões para angariar fundos destinados à construção das Escolas Primárias de Cabeça das Mós.”

25 de Dezembro de 1945

“A estrada Sardoal – Cabeça das Mós passou a estrada nacional e brevemente vai ser empedrada.”

Sardoal, Abril de 1999          

Proposta para alterações toponímicas a algumas ruas da Vila de Sardoal

Rua 5 de Outubro / Estrada das Sentieiras
Rua Viscondes do Sardoal

Estrada das Sentieiras / Limite do espaço urbano
Rua Dr. Manuel Constâncio

Rua Viscondes de Sardoal / Cruzamento para o Cabeço
Rua da Sequeira

Rua da Sequeira / Limite do espaço urbano
Rua do Chão das Maias

Rua da Sequeira / Caminho do Vale do Mú
Travessa da Sequeira

Rua da Sequeira / Cabeço
Rua do Cabeço

Rua do Paço/ Praça da Palha / Rua do Chafariz
Travessa do Paço

Rua da Amargura / Rua da Amoreira
Escadinhas da Amargura

Rua do Adro / Casa do Adro
Travessa Dr. Anacleto Matos e Silva

Travessa Dr. Anacleto de Matos Silva / Adro
Escadinhas Eng.º José Matos e Silva

Travessa da Pimenteira / Rua das Olarias
Travessa das Olarias

Travessa das Olarias / Rua das Olarias
Escadinhas das Olarias

Rua das Olarias / Ponte de S. Sebastião
Travessa de S. Sebastião

Rua Bivar Salgado / Ponte de S. Sebastião / Limite do Espaço Urbano
Rua de S. Sebastião

Rua Lúcio Serras Pereira / Rua Viscondes do Sardoal
Rua dos Quinchosos

Rua Lúcio Serras Pereira / Rua Lúcio Serras Pereira ( Edifício D. João III)
Rua do Outeiro da Velha

Arruamento Central do Bairro da Cruz Vermelha / Calouste Gulbenkian
Largo da Cruz Vermelha

Rua da Fonte Velha / Rua dos Quinchosos
Rua do Sarabando

Rua 5 de Outubro / Rua Lúcio Serras Pereira (Rua F)
Rua Cónego João H. Sequeira Mora

Avenida D. João III / Rua Rainha D. Leonor
Rua Rainha Santa Isabel
Nota: esta designação toponímica pode já ter sido atribuída, sendo apenas necessário substituir as placas toponímicas que a identificam como Rua 22 de Setembro.

Avenida Luís de Camões / Rotunda da Taberna Seca
Rua 5 de Outubro
Esta alteração pretende apenas englobar na Rua 5 de Outubro o troço de arruamento que liga a entrada principal do Centro Cultural Gil Vicente à Rotunda da Taberna Seca.

Rua 5 de Outubro / Largo do Convento
Rua do Convento

Rua Bivar Salgado / Rotunda da Taberna Seca
Avenida Heróis do Ultramar
Esta alteração pretende apenas englobar na Avenida Heróis do Ultramar, o troço de arruamento que liga a entrada da Rua David Serras Pereira à Rotunda da Taberna Seca.

Rotunda da Taberna Seca /Rua Dr. David Serras Pereira
Rua de S. Miguel ou em alternativa Rua da Tapada do Américo

Rua Cónego Silva Martins / Rua de S. Miguel ou da Tapada do Américo
Travessa de Santa Catarina – Apenas para clarificar a designação já atribuída.

Rua 5 de Outubro/ Rua de S- Miguel
Travessa de Sant’Ana

Avenida Heróis do Ultramar /Avenida Heróis do Ultramar, pela entrada das antigas Escolas primárias.
Rua do Alto da Escola ou em alternativa Rua Professora D. Alzira Trindade Reis

Rotunda da Taberna Seca / Cemitério Municipal
Rua do Cemitério ou em alternativa Rua da Saudade

Avenida Heróis do Ultramar / Rua do Cemitério
Rua Dr. Raúl Wheelhouse

Rua Dr. Raul Wheelhouse / Rua do Cemitério
Rua Dr. José Ferreira Manso

Rotunda da Taberna Seca / Piscina Coberta
Rua D. Gaspar Barata de Mendonça

Piscina Coberta / Limite do Espaço Urbano (Fonte da Estrada)
Rua da Fonte da Estrada

Rotunda da Taberna Seca / Quinta das Gaias (Limite do Espaço Urbano)
Rua Padre António Carvalho de Parada

Rua Padre António Carvalho de Parada / Quinta do Fraião
Rua do Fraião

Rua Padre António Carvalho de Parada / Piscina Coberta
Rua 25 de Abril (esta designação já foi atribuída a este arruamento há vários anos)

Rua 25 de Abril / Rua D. Gaspar Barata de Mendonça (Rua do Impasse)
Rua 1.º de Maio

Rua 25 de Abril / Rua D. Gaspar Barata de Mendonça (Bombeiros)
Rua dos Bombeiros Municipais

Rally Paper – Festas do Concelho 1996

Bom dia! Este Rally Paper nada tem a ver com o Grande Prémio de Portugal…

Os objectivos da Organização são apenas a criação de uma oportunidade de convívio e ao mesmo tempo divulgar o nosso Concelho, neste dia de Festa em que se comemora o aniversário da elevação do antigo lugar de Sardoal à categoria de Vila.

Estabelecemos como tempo limite para a realização da prova 2 (duas) horas e 30 (trinta) minutos, nem mais nem menos! Cada minuto a mais ou a menos será penalizado com um ponto. Preparem-se para dois ou três percursos em terra batida em que a defesa e salvaguarda das vossas máquinas fica inteiramente a vosso cargo, como, aliás, terá que acontecer em qualquer tipo de piso e de percurso.

E cumpram o Código da Estrada, porque a Organização não paga multas. Como é de tradição neste tipo de iniciativas, a organização não se responsabiliza por qualquer acidente.

A partida é na Praça da República, antes chamada Praça Conselheiro João Franco e no início do século XVII, Praça Nova. Quando querem marcar encontros ou se referem a ela, os “Lagartos” costumam usar, simplesmente, “no Pelourinho”.

O primitivo pelourinho do Sardoal não estava neste local. Com uma simples observação podem dizer-nos quando este foi aqui colocado, após um trabalho em que colaborou o Arquitecto Raul Lino. Em que ano foi feita essa colocação? ______

Ainda nesta Praça, que também podemos designar como a nossa sala de visitas, encontram outras referências culturais importantes desta terra. Na parede sul da Igreja do Espírito Santo está um painel de azulejos que é contemporâneo do Pelourinho.

Quem é o seu autor? ______

E agora façam-se à estrada. Subam a Rua do Vale, que também tem outro nome, que podem encontrar logo a seguir à Capela de Sant’Ana. Qual é a designação toponímica oficial desta rua? ______

Depois, sempre no estrito cumprimento do Código da Estrada, sigam a indicação das setas brancas em fundo azul. Procurem uma placa informativa com algumas velas (náuticas) e procurem segui-la. Fausto Bordalo Dias, no seu melhor trabalho, bem diz “Navegar, Navegar”. Se  quisessem navegar, no espaço que há algumas dezenas de anos se poderia denominar casa de pasto, onde o poderiam fazer? ______

Estão agora num local chamado Fonte da Estrada. Continuem até aos sobreiros. À esquerda encontram um cruzamento. Poderiam regressar ao Sardoal por aí. Mas não é isso que pretendemos. Vão encontrar uma curiosa simbiose religiosa entre o Judeus e Católicos. A Estrela de David e Nossa Senhora de Fátima, na entrada para uma quinta. Como se chama essa Quinta? ______

Em 1712, o Padre Carvalho da Costa escrevia: “Os Andreus, que são três aldeias…”. Hoje é só uma e até as muitas tabernas e cafés que ali existiam ficaram reduzidas a alguns representantes. Na casa onde se pode ler que “O Sol quando nasce é para todos” funcionava uma dessas tabernas. Como se chamava o seu proprietário? ______

Das muitas tabernas que existiam, há uma que ainda funciona, próxima da Capela de S. Guilherme. A esta hora deve estar fechada. Como se chama o taberneiro? ______

A estrada que vão seguir até a Fonte do Salgueiral está em obras. A condução pode exigir algum cuidado. Antes da ponte, cortem à esquerda e sigam até às Lameiras, passando próximo da Escola. Pelo caminho havia alguns lagares.

Quantos estão em funcionamento? ______

Antes da Igreja Paroquial, à direita, há um caminho que para muitos não tem regresso. Sigam-no. Os mortos merecem a nossa homenagem e S. Tiago também. Qual é a data mais antiga que está inscrita na zona envolvente da Capela e do Cemitério? ______

Nos registos antigos, a povoação mais próxima chamava-se S. Domingos da Roda. Hoje é apenas S. Domingos. Antes de lá chegar têm o primeiro percurso em terra batida.

A direcção que devem seguir é poente. Cuidado com a suspensão!…

Não saiam do Concelho de Sardoal, ainda que percorram a antiga Estrada Nacional n.º 2. Não parem na Salgueira, ainda que o Menino Jesus (vulgo Manuel da Conceição Dias) gostasse muito de os receber. Continuem até ao cruzamento para a Matagosa e para a Portela da Selada. Do lado direito hão-de encontrar uma fonte. Não é má língua, mas sabemos que a vossa sede não é de água. Por isso atravessem a estrada, que o Senhor Lourenço está à vossa espera. Olhem a tasca, com olhos de ver, desde a entrada. Diga-nos o número do Travassos e já agora também o do Eusébio: ______

O Senhor Lourenço não tem culpa de nada e precisa de ganhar a vida. Vocês podem perder-se e ter de almoçar pelo caminho, portanto podem comprar-lhe uma latinha de sardinhas de conserva da marca “Pescador”. Se a comerem pelo caminho guardem a embalagem para nos mostrarem no final…

Procurem ao Senhor Lourenço qual o melhor caminho para a aldeia do Codes. Não vale a pena descer até ao coração da aldeia.

É a altura de abrir o envelope n.º 1. Orientem-se pela carta e voltem a ter cuidado com a suspensão, pois vão regressar à terra batida!…

Este percurso guiado (por carta) termina quando encontrarem uma via rápida.

Nas placas de sinalização hão-de encontrar a palavra “Venda”. Sigam-na!

Não se vende lá muita coisa. Tão pouco nos interessa saber se vos dão, se compram ou se roubam um fruto que não é muito vulgar comer-se na sua forma natural.

Há quem goste deles assados ou em compota. Traga-nos um desses frutos. Para não perderem muito tempo não façam ou não tentem fazer “marmelada”!…

Vão para Panascos?

Passem pelos Carrascais e voltam a encontrar uma fonte. Não há nenhuma tarefa para cumprir por aqui. Apenas perto da Capela, a religiosa ou a do Senhor António Gaspar, há uma tarefa para cumprir. No Brescovo compraram a lata de sardinhas. Para complementar, uma cebolinha dava jeito… Talvez a possam adquirir nos Panascos.

Tragam um desses bolbos. Não a cortem porque podem chorar. De qualquer forma, vão à antiga fonte de Panascos onde podem encontrar uma placa evocativa da data da sua construção. Não é a égide que queremos saber, mas, tão somente, quantos anos faz essa fonte amanhã? ______

Dirijam-se à Estrada Nacional n.º 244-3 e no Tojalinho vão encontrar uma placa de sinalização que tem ARTE e rima com Tojalinho. Sigam-na!

Não queremos que joguem futebol nem que visitem as obras do Centro de Dia que a Associação Para a Assistência Domiciliária de Alcaravela está a construir.

Na sede da Cooperativa, sobre a porta principal há um pequeno painel de azulejos.

Descrevam-no: ______

Por esta hora ainda pode estar a decorrer o Mercado Semanal, em Santa Clara.

O Senhor João Avelino talvez vos possa servir uns traçadinhos.

No Largo está a única estátua do Concelho de Sardoal. Em que ano nasceu a personalidade que representa? ______

Vivemos felizmente em liberdade, mas próximo daqui há uma localidade cujo nome parece significar o contrário. Algumas centenas de metros após o cemitério, vão encontrar um pavimento novo. Sigam-no até ao Largo das Festas, junto à Capela. Não encontram, escrita, a resposta para a pergunta que formulamos. Podem, por isso, ter necessidade(s) (não de natureza fisiológica) para obterem essa resposta. A pergunta é esta: qual é o(a) padroeiro(a) da Capela? ______

Sigam para Fontelas. No café do Pita tentem melhorar o almoço, reunindo géneros para uma salada. Talvez um tomate (fruto), e porque o café é do Pita, uma pitada de sal. Não consumam porque têm que entregar esses géneros no final.

Sigam para Casos Novos até à placa indicativa de Vale Formoso. A estrada é estreita. Conduzam, por isso, com cuidado. A pouca distância dali encontram uma placa a indicar Pisão. Vão regressar à terra batida, apenas algumas poucas centenas de metros. No Pisão talvez se surpreendam por ali existir uma capela. Mas existe!

Sobre a porta principal do templo, entre outras palavras, está uma inscrição que queremos que transcrevam: ______

E já agora, digam-nos qual é o significado da palavra com mais caracteres? ______

Junto à capela, à direita, há um caminho que vos leva de regresso à estrada para Vale Formoso. Sigam-no. Passem por Vale Formoso e entrem no concelho de Abrantes. Não vão às Lercas! Mas no alto da Serra das Lercas, depois da curva mais acentuada e perigosa do percurso, a poente, avistam uma povoação do Concelho de Sardoal. Qual é? ______

Depois de Entre Serras, vão seguir pela Estrada Nacional n.º 358-3, para poente.

Vão encontrar uma ponte. Em que data foi inaugurada? _______

Entrem em Cabeça das Mós por onde quiserem, mas vão ao Largo onde habitualmente se realizam as Festas daquela localidade. Qual é a designação toponímica desse largo? ______

Na sede da Comissão de Melhoramentos procurem o emblema daquela colectividade. Descrevam-no: ______

No interior, na parede, hão-de encontrar uma serigrafia de Álvaro Mendes que representa um local de grande afectividade para as Aldeias de Cabeça das Mós, Entrevinhas e Palhota. É o vosso próximo destino. Sigam para lá!

Nesse local não há telefones, a não ser que levem telemóvel, mas na horizontal e sobre a àgua vão encontrar alguns postes, habitualmente utilizados pela PORTUGAL TELECOM. Quantos? ______

Passe sobre a água e procure água para beber. Quantas bicas encontra? ______

Regressem desse local mas não passem a ponte. É só mais um pouco de terra batida. No Largo Tiago dos Santos Batista, sigam pelo caminho da esquerda.

Um pouco à frente encontram uma moradia com um brasão de família. Qual é essa família? ______

Mais à frente, sigam pela Rua da Ladeira e pela Rua das Casas até à fonte.

Subam até encontrarem um cruzeiro. Qual é a data que aí está inscrita? ______

No Largo João Lopes Davide, suba pelo caminho da esquerda. No alto, a seguir aos eucaliptos, siga também pela esquerda. Não trave nenhum combate como D. Quixote, porque tiraram as velas. No próximo ano já cá devem estar outra vez.

Aprecie a paisagem e volte ao local num dia à noite ou ao pôr-do-sol.

Em quantos locais se podiam ali moer cereais? ______

Num desses locais, o que encontra mais próximo do poste, apesar das ruínas é perfeitamente visível uma data. Transcreva-a: ______

Regressem a Entrevinhas. Depois da Fonte de Santo António encontra outra fonte.

Para outras sedes. Bebam o que quiserem e paguem!…

O espaço está diferente e quando quiserem também podem almoçar ou jantar.

Hoje não é muito conveniente almoçarem.

Já trazem algum material para o almoço, mas talvez seja bom irem pensando na sobremesa. Algo doce, com melaço de fruta e amendoins. A Fernanda e o Zé sabem o que queremos. Não sejam gulosos, porque é só para ser comido no Sardoal. Tragam-nos essa sobremesa.

Saindo de Entrevinhas, pelo Caminho dos Mortos, atravessem a Estrada Nacional 358-3 e vão para Valhascos.

No Largo principal procurem saber duas coisas.

Quantas cruzes tem a torre da Igreja de Nossa Senhora da Graça? ______

E o que é que os Josés lhe ofereceram? ______

Sigam pela estrada em obras. Junto da Associação Cultural e Desportiva de Valhascos, procurem o emblema dessa Associação. Digam-nos: qual é o símbolo principal que o integra? ______

Seguindo a estrada em direcção ao Ribeiro David, encontra antes um local chamado Machorra, onde durante muitas décadas foi exercida uma arte de grande tradição em Valhascos. Alguns dos últimos executantes pereceram, ali, de forma dramática, em consequência de um acidente na execução da sua arte. A que arte nos referimos? ______

Depois de todos estes quilómetros e de alguns pisos menos convenientes, o veículo em que se fazem transportar deve precisar de ir à inspecção (não à Inspecção Militar; a última que se realizou no Sardoal foi em 1972, onde estiveram presentes, pelo menos, dois mancebos hoje quarentões e com alguma responsabilidade na organização destas Festas do Concelho, como estiveram também profundamente empenhados na realização da 1.ª Semana Cultural que o GETAS-Centro Cultural de Sardoal realizou em Setembro de 1986). Sobre Inspecções Militares ou de veículos automóveis, propomos duas questões:

Qual é a empresa que gere o Centro de Inspecções Automóveis instalado na Zona Industrial de Sardoal? ______

E indiquem-nos o nome de um dos mancebos da freguesia de Sardoal que tenha ido à Inspecção Militar no ano de 1972? ______

Para ajudar na resposta a esta questão, diremos, apenas, que esses Sardoalenses fazem ou fizeram 44 anos durante 1996.

Dirijam-se, agora, à Vila do Sardoal, entrando pelo primeiro cruzamento da nova Estrada Nacional n.º 2. Passem a Ponte do Ramal. Logo a seguir está uma placa indicativa de uma fonte. Nessa placa falta um número. Qual? ______

Vão, depois, pelas Olarias. Procurem a Praça Máximo Maria Serrão e Rua Bivar Salgado. Hão-de encontrar uma fonte, a que há dois anos foram cantados os parabéns pelo seu centenário. Hoje pode dizer-se que tem água com farturas. Qual foi o ano da sua inauguração? ______

Regressem ao local da partida. Mas antes e porque já trazem alguns géneros para o almoço, completem a ementa. Falta o pão e uma bebida. Sem estes podem passar fome e sede. Por isso, não se esqueçam de os apresentar!

22 de Setembro de 1996

Posturas Antigas do Concelho de Sardoal

Este trabalho reúne as Posturas Antigas do Concelho de Sardoal desde o Século XVII até ao Século XIX.

Através delas, podemos perceber muito sobre a estrutura social, modos de vida e preocupações dos Autarcas. O primeiro Código de Posturas que existe no Arquivo Municipal é de 1603–1604, mas o mesmo encontra-se profundamente deteriorado e a sua leitura é quase impossível na sua maior parte.

As posturas são ordens ou disposições emanadas das Câmaras Municipais e tendentes à regularização de determinados serviços na área do concelho.

Passeio pedestre: Rota dos Cultos Antigos

Por vales e montes: à procura de ruínas e não só!…

O percurso deste passeio foi marcado por forma a que os participantes passem por alguns sítios que durante séculos foram importantes locais de culto dos povos do Sardoal e de algumas povoações do vizinho concelho de Abrantes (Carvalhal, Casais de Revelhos e Sentieiras).

Tem início na Vila do Sardoal, na Praça da República, junto à Capela do Espírito Santo, um dos locais de culto mais antigos do Sardoal, existindo provas documentais de que a Festa do Espírito Santo já se realizava antes de 1470.

Descendo para a Fonte Velha, passarão depois junto ao Sobreiro de D. Maria, uma das árvores classificadas do Sardoal, seguindo depois pelo antigo caminho das Sentieiras, ao longo da Quinta do Coro, atravessando as suas vinhas, a partir do Alto do Ramalhão, até chegar ao caminho municipal para as Sentieiras.

A partir das uvas destas vinhas, produz-se um excelente vinho, já premiado em termos nacionais e internacionais.As receitas conventuais recolhidas pela sua proprietária, D. Florinda Pires, são a base de alguns produtos de grande qualidade, como a marmelada, as compotas, a geleia e o licor de rosas e os figos pingo de mel.

Algures, à esquerda, situava-se a antiquíssima ermida de Santa Maria Madalena, que nos meados do século XVIII já se encontrava arruinada, mas da qual se sabe que no século XVI era objecto de grande devoção por parte dos povos circunvizinhos.

Seguindo o caminho para as Sentieiras, um pouco antes do marco que assinala o limite dos concelhos de Sardoal e Abrantes, à esquerda, podemos avistar a Quinta do Vale da Lousa, também chamada Quinta do Constâncio.

Esta quinta terá sido fundada pelo Dr. Manuel Constâncio (1726-1817), cirurgião e lente de Anatomia, patrono do Hospital de Abrantes e de cuja filha, Maria Margarida, se diz ter sido a Marília, musa inspiradora das poesias românticas de Bocage.

O Dr. Manuel Constâncio encontra-se sepultado junto ao altar da capela privativa da quinta, em cuja adega também se produzem vinhos de boa qualidade, comercializados sob a marca “Cantarinho” e que tem um parque/jardim com espécies exóticas e autóctones variadas. Infelizmente não nos foi concedida autorização para visitar a Quinta do Vale da Lousa.

Assim, continuamos pelo caminho das Sentieiras, entrando no concelho de Abrantes. À nossa esquerda, na encosta fronteira, está a aldeia das Sentieiras que não chegaremos a visitar, porque antes da ponte que cruza a ribeira vamos seguir pelo caminho à direita, que segue paralelo à ribeira, para norte. O povoamento vegetal que vamos encontrar, quer nas margens da ribeira, quer nas encostas adjacentes, merece uma observação atenta, pela variedade da flora existente e pelo tamanho de algumas espécies.

Pouco depois de deixar o concelho de Abrantes entrando, de novo, no concelho de Sardoal, encobertas por vegetação diversa e afastadas algumas dezenas de metros do caminho, à direita, encontram-se as ruínas da antiquíssima Igreja de S. Miguel de Alferrarede, com cemitério anexo, e que segundo a tradição popular terá sido o local de culto para os povos de Casais de Revelhos e de Sentieiras (que apesar de pertencerem ao termo de Abrantes, durante séculos pertenceram em termos religiosos à Paróquia de S. Tiago e S. Mateus de Sardoal).

Ruínas da Igreja de S. Miguel de Alferrarede (fotografia: Novembro 1999)

A limpeza e posterior levantamento arqueológico da Igreja e da sua área envolvente pode fazer alguma luz sobre a importância histórica deste local.

Retomando o caminho para S. Simão, aproveitando, se for caso disso, as sombras das frondosas árvores que ladeiam a ribeira, seguindo sempre o caminho mais próximo da ribeira, irá passar perto das primeiras casas da aldeia de S. Simão que, por uma questão de tempo e extensão do percurso não chegaremos a visitar. Esta aldeia que durante séculos se chamou Alferrarede, deve ser uma das mais antigas do concelho de Sardoal e tem uma interessante capela com pia baptismal o que indicia uma existência anterior ao Concílio de Trento (meados do século XVI), até porque a vintena de Alferrarede aparece referenciada no Censo Geral do Reino de 1527.

Antes de chegar ao caminho municipal Sardoal/S. Simão, peça que lhe indiquem o caminho para o que parece ser uma ponte romana.

Seguindo pelo Vale da Amarela, continuando a encontrar uma cobertura vegetal diversificada e pouco vulgar, não demorará muito a chegar ao Vale Carvalho.

Com muito cuidado, devido ao trânsito automóvel, siga pela EN 358 em direcção a Carvalhal. Desvie-se para a floresta no primeiro caminho à direita, seguindo-o até ao ponto onde termina.

Siga, depois, por um carreiro íngreme que vai subir até encontrar o caminho da Senhora da Saúde, que continuará a subir até encontrar a Ermida da Senhora da Saúde, recentemente restaurada, no local onde existiam as ruínas da Ermida de Nossa Senhora dos Barbilongos, assim era chamada no século XVI, por ali viverem uns monges de grandes barbas e que depois da grande peste de 1580, por ali terem encontrado abrigo e cura muitos dos moradores de Andreus afectados por aquele flagelo, passou a ter a invocação da Senhora da Saúde, que ainda hoje se mantém em Andreus.

Pode aproveitar para fazer uma pequena pausa para descanso, após o que irá descer o caminho da Senhora da Saúde, podendo constatar que o aforismo popular para baixo todos os santos ajudam, não é tão verdadeiro como pode parecer. Nas proximidades de Andreus vai voltar a encontrar asfalto. Dentro da aldeia de Andreus continue pelo caminho da Senhora da Saúde, agora a subir, até à Rua da Eira, que seguirá, à esquerda, até encontrar a Capela de S. Guilherme, que no século XVIII era o padroeiro das três aldeias que então existiam e que se juntaram para formar a actual aldeia de Andreus. Seguindo pela Avenida da Associação de Moradores de Andreus, pode fazer uma paragem num dos cafés do Porto, para tomar um café ou outra bebida que lhe apeteça. Subindo pela Rua 25 de Abril, volte a atravessar a EN 358, seguindo no caminho em frente até encontrar os muros da Tapada das Touces. Siga pelo caminho da direita, até perto do Poço Redondo, desviando pelo caminho florestal que liga ao Alto do Chão das Maias / Vale de Encimão, onde volta a encontrar o caminho municipal Sardoal / S. Simão, que seguirá à direita durante alguns metros, até encontrar à esquerda indicação “Tomada de Água”, seguindo o caminho florestal que sobe para o Alto de S. Domingos, onde próximo do tanque para abastecimento de carros de bombeiros e de helicópteros, à direita, encobertas por pinheiros e eucaliptos, poderá encontrar as ruínas da antiquíssima Ermida de S. Domingos, adjacente ao local onde foi construído o primeiro campo de futebol de Sardoal. Próximo deste local têm sido encontrados diversos vestígios arqueológicos, nomeadamente machados de pedra polida do Paleolítico Superior, o que indicia um espaço de povoamento muito antigo.

Seguindo as orientações da organização desça para o Cabeço / Vale da Carreira, até voltar a encontrar o caminho municipal Sardoal / S. Simão, descendo pela Sequeira até ao Sardoal.

22 de Setembro de 2002

Como era o Sardoal antigo?

Vista aérea do Sardoal em 1987 (fotografia de Maurício Abreu)

No dia 11 de Janeiro de 2013 passaram setecentos anos sobre a data de emissão do documento mais antigo que se conserva no Arquivo Municipal de Sardoal. Trata-se de uma carta da Rainha Santa Isabel que foi donatária do antigo lugar e depois vila de Sardoal, dada aos moradores do dito lugar, ordenando aos passageiros que viessem da Beira para Abrantes e Punhete (actual Constância) e vice-versa, a passar por dentro do lugar de Sardoal, e a deixar a estrada próxima. Não menos importante é uma outra carta dada pela mesma Rainha em 20 de Setembro de 1318, para que os moradores do dito lugar pudessem conservar a posse antiga em que estavam de ter alcaide natural do mesmo lugar de Sardoal.

Estes documentos comprovam a antiguidade desta terra cuja existência deve ser anterior à da nacionalidade portuguesa, ainda que não conheça documentos que permitam precisar uma data para tal ocorrência

Sabe-se, pela referida carta, que em 1313 eram aqui Juízes Gonçalo Fernandes e Vicente Annes, num tempo em que o Reino de Portugal tinha cerca de 170 anos, tempo muito apertado para ganhar esta importância, não sendo, por isso, muito difícil de admitir que a fundação do lugar de Sardoal seja anterior à da nacionalidade portuguesa.

Jacinto Serrão da Mota, no seu manuscrito «Memórias Restauradas do Antigo Lugar e Vila de Sardoal», escrito em meados do século XVIII, que se guarda no Arquivo Municipal de Sardoal, deixa várias pistas para importantes vestígios de povoamentos antigos nas proximidades do Sardoal, que atestam a presença do homem desde tempos primitivos, com especial destaque para as ruínas da que teria sido uma importante povoação tubucense, no local que designa por Castelo de Arcez.

Tanto quanto sei, estas pistas nunca foram estudadas por investigadores qualificados, em especial no âmbito da Arqueologia, admitindo que muitos locais possam ter sido vandalizados por curiosos em busca de eventuais tesouros enterrados pelos povos primitivos que por aqui habitaram.

Mas como seria o lugar de Sardoal no princípio do século XIII?

Para tentar responder a esta pergunta socorro-me da localização das fontes de água potável mais antigas que se conhecem que tinham, como é de calcular, uma importância crucial para a população. Estas fontes públicas deveriam ser a Fonte dos Lobos e a Fonte do Vale da Gala, para sul e a Fonte Nova e a Fonte Velha para poente. Refere-se a circunstância de estas fontes ainda existirem, apesar de não terem uso há muitos anos, por serem fontes de mergulho, facto que desaconselha a sua utilização para consumo humano. Mas a sua importância histórica justificava a sua limpeza e conservação pelas autoridades locais, como marcos da nossa memória colectiva que correm sérios riscos de desaparecer para sempre.

O Sardoal medieval devia estender-se numa faixa próxima da Ribeira da Laje e da Ribeira do Sardoal, que corresponde de grosso modo às actuais Rua do Paço, Rua do Poço dos Açougues, Rua Velha, Travessa do Paço, Praça da Palha, Rua do Chafariz, Rua da Amoreira, Rua da Amargura, Rua da Portela e Rua das Olarias.

Sabe-se que a primitiva Matriz de Sardoal era dedicada apenas a S. Mateus (S. Tiago apenas passaria a ser, também, orago da Paróquia de Sardoal em meados do século XV). Serrão da Mota localiza esta Igreja de S. Mateus um pouco abaixo da Igreja da Misericórdia onde, segundo ele, em meados do século XVIII ainda existia um arco que o povo chamava de S. Mateus, que mais denotava ser de porta lateral do que de porta principal.

Para além dessa igreja existem memórias de antigas capelas nos arredores do Sardoal como as de S. Francisco, S. Domingos, S. Miguel de Alferrarede e de Santa Maria Madalena, existindo apenas vestígios da de S. Domingos e da de S. Miguel, sendo provável que já existisse a Igreja do Espírito Santo que se sabe ter sido restaurada no início do século XVII.

A actual Igreja Matriz da Paróquia de S. Tiago e S. Mateus foi construída em meados do século XV, numa altura em que a povoação do Sardoal se expandia para norte ocupando o espaço que é limitado pela actual Rua dos Mestres de Sardoal e pela Praça da República/ Rua Vasco Homem. Nos finais do século XV ou nos princípios do século XVI existiam nas traseiras da Igreja do Espírito Santo uma casas onde se sabe ter estado hospedado o Rei D. Manuel, como consta de uma escritura pública que Serrão da Mota refere no seu livro atrás citado.

Através da escritura de compra pela Câmara que se guarda no Arquivo Municipal sabe-se que nos primeiros anos do século XVII já existia a Rua Vasco Homem e que a Praça da República se chamava, então, Praça Nova.

Janeiro de 2013

Monografia: Igreja Matriz da Paróquia de S. Tiago e S. Mateus de Sardoal

Monografia com alguns elementos da história da Igreja Matriz da Paróquia de S. Tiago e S. Mateus, incluindo também uma resenha biográfica dos sacerdotes naturais do concelho de Sardoal que mais marcaram a vida religiosa e política da terra.

  • Origens da Paróquia
  • Igreja Matriz: Algumas Referências Artísticas
    • Azulejo
    • Talha Dourada
    • Retábulo
    • Outros motivos de interesse
  • Auto do Inventário da Paróquia em 1910
  • Algumas relações e inventários entre 1857 e 1868
  • Alguma correspondência entre 1904 e 1912
  • Alguma Correspondência relacionada com a aplicação da Lei da Separação
  • Informação Sobre a Igreja e Benefícios do Sardoal – 1805
  • Datas das colações de benefícios da Igreja do Sardoal, nomes dos beneficiados e notícia dos apresentantes
  • Caderno da derrama da Congrua dos Párocos da Freguesia de São Tiago e São Mateus, ano económico de 1859 a 1860
  • Alguns Sacerdotes e Religiosos Ilustres naturais da Paróquia de Sardoal
    • D. António Alves Ferreira
    • Padre António De Carvalho De Parada
    • Cónego António Joaquim Da Silva Martins
    • Padre António Rodrigues Falcão
    • Padre Francisco Alves Ferreira
    • Frei Quintino Do Sardoal
    • D. Gaspar Barata De Mendonça
    • Cónego Dr. João Henriques De Sequeira Mora
    • Padre João Lopes De Andrade
    • Padre João Dos Santos
    • Padre José Lopes
    • Padre Dr. Luís De Andrade E Silva
    • Frei Luís Ribeiro De Guimarães Drake
    • Padre Manuel Lopes Alpalhão
    • Padre Manuel Lourenço
    • Padre Manuel Dos Santos
Igreja Matriz da Paróquia de S. Tiago e S. Mateus (2013)

Algumas notas sobre a Capela de Nossa Senhora da Lapa

Do Título IX da obra “Santuário Mariano” coligida no princípio do século XVIII, por Frei Agostinho de Santa Maria, consta a seguinte nota sobre a Senhora da Lapa:

Da milagrosa Imagem de Nossa Senhora da Lapa, do termo do Sardoal

No mesmo termo e limites da Vila do Sardoal para a parte de nascente em distância de meia légua e muito junto à Ribeira de Aracês se vê o Santuário de Nossa Senhora da Lapa em um ameno vale e situado em uma pequena penha, sobre a qual fundaram, a qual é quadrada, mas de boa arquitectura e proporção. Não é grande mas para o sítio de bastante capacidade. Tem um só Altar e na porta se vê um patim, que sobe de junto à ribeira, que por um e outro lado tem cinco degraus, porque não deu lugar a penha para maior extensão. Defronte ou da outra parte da ribeira continua o mesmo rochedo, no qual se vê uma lapa em que é tradição constante aparecera a Senhora, cuja manifestação ainda não sendo de muitos séculos, já hoje não há quem saiba dizer dela nada com certeza.

Junto àquele sítio havia uma quinta de que era Senhor o Abade João Cansado. Ele por devoção da Senhora, para o melhorar de sítio e para não apartar muito do lugar que escolhera, lhe edificou aquela Ermida e Santuário em que a colocou e refere-se por tradição que muitas vezes fugira e fora buscar o primeiro sítio em que aparecera, mas depois que de todo se lhe acabou e aparelhou lugar em que pudesse ser venerada, se lhe pediu com rendido afecto o aceitasse. E assim houve a Senhora de conceder com os seus rogos e ficou sem fazer mais mudança.

Depois colocaram na mesma lapa uma Imagem da Santa Madalena, como ao presente se vê. Esta lapa dista menos da Ermida de cem palmos e quando a ribeira enche chegam as suas águas à lapa e também às portas da casa da Senhora. É esta Santíssima Imagem de escultura de madeira, mas muito linda. Sua estatura são dois palmos. Não tem Menino e está com o ornato de um manto e coroa de prata. Está colocada no meio do retábulo do seu Altar. É hoje Padroeiro deste Santuário Duarte de Sousa da França, sobrinho do Abade ou de seus filhos, que tem junto à Ermida da Senhora uma quinta com grandes casas, herança tudo do mesmo Abade João Cansado. Nestas se recolhem os Romeiros e devotos da Senhora, quando o tempo os obriga a pernoitar na sua casa ou quando a sua devoção o pede. Em todo o ano se vêm naquela casa da Senhora romagens e devotos.

Obra Deus por meio desta celestial Imagem de sua Santíssima Mãe, muitos milagres e maravilhas, como o estão testemunhando muitas memórias e sinais delas como quadros, mortalhas e outras coisas semelhantes que se vêm pender das paredes daquele Santuário.

A fundação deste Santuário não é muito antiga porque ainda hoje há pessoas que se lembram de o fundar o Abade.

Não me constou o dia em que os Padroeiros festejam a Senhora.”

Da leitura desta memória pode inferir-se que a Capela da Lapa terá sido fundada por volta do meado do século XVII, ainda que com rigor não se possa determinar o ano.

Capela de Nossa Senhora da Lapa (2020)

No dia 3 de Julho de 1926, publicava o Jornal “As Novidades” a seguinte notícia:

Sardoal – Festa da Lapa

Teve lugar no dia de S. João, a Peregrinação Eucarística ao vizinho lugar da Lapa, na aldeia de Cabeça das Mós, a qual se vem realizando já há bastantes anos.

Diz uma prática que neste local, onde se encontra um santuário dedicado à Mãe de Deus, apareceu outrora a Virgem Santíssima e que ali estivera desterrado pelas perseguições do seu tempo um Bispo Católico (1), cujos restos mortais se encontram na Igreja do Convento, desta Vila. Fosse como fosse e o certo é que estas peregrinações que o zelo apostólico do nosso bondosíssimo Vigário (2) vem promovendo, são já grandiosas manifestações de Fé, pois a elas ocorrem os fiéis das freguesias vizinhas, os quais, em extrema união, louvam a Deus e honram a sua Mãe Maria Santíssima.

Assim vimos ali um numeroso grupo de peregrinos, não só desta Vila, aos quais presidia o nosso venerando pároco, indo à frente os estandartes das associações das Juventudes Católicas, mas também de Alcaravela, os quais guiados pelos seus vistosos estandartes e dirigidos pela sua ordem, pelo seu zeloso prior, todos edificavam pela sua ordem e compostura e devoção!…

De Aboborerira que conduzidos pelo seu digno Prior, vieram de muito longe. De Santiago de Montalegre, de Valhascos, de Cabeça das Mós, de Sentieiras, da Queixoperra, todas com os seus estandartes à frente. Todos os peregrinos vieram das suas terras, entoando cânticos ao Senhor, dando uma nota impressionante por onde passavam.

De manhã houve missa campal cantada, comunhão geral e sermão, retirando-se no final todos muito bem impressionados, havendo sempre a mais alegre confraternização entre todos.

À despedida foram impressionadas quentes palavras de fé e união pelos Reverendos Párocos, tendo sido salientada a nota de estreitamento de fiéis com os nossos venerandos prelados, para eficaz reivindicação das liberdades católicas.

Foram levantados entusiásticos vivas a Jesus Cristo, a Maria Santíssima, à Santa Igreja Católica e ao nosso prestigioso Vigário – Arcipreste desta Vila, a quem Deus conserve por muitos e dilatados anos.

Devem ter assistido 2 500 pessoas.”

(1) O Bispo Católico a que o correspondente se refere é D. Gaspar Barata de Mendonça, que foi o 1º Arcebispo da Baía e Primaz do Brasil, natural da Vila de Sardoal onde nasceu em 3 de Agosto de 1627, vindo a falecer em 11 de Dezembro de 1686, vítima de doença grave, provavelmente tuberculose.
Entre outros cargos elevados que exerceu, foi nomeado 1º Arcebispo da Baía em 16 de Novembro de 1676, pela Bula “Divina Disponente Clementis”, emanada do Papa Inocêncio XI, não tendo chegado a ir para o Brasil, por força da doença que o acometeu.
São dessa altura os seus longos períodos de vilegiatura e convalescença na zona de Arcez e Lapa, pertencente a seus familiares directos, onde em contacto pleno com a natureza dessa paisagem idílica e, ao mesmo tempo, sedativa e repousante, procurava haurir a saúde perdida.

(2) Era Pároco do Sardoal nesta época o Padre António Joaquim Silva Martins, natural de Entrevinhas, onde nasceu em 15 de Março de 1868, tendo falecido no Sardoal em 25 de Dezembro de 1943. Foi Pároco da freguesia de S. Tiago e S. Mateus do Sardoal, entre 2 de Janeiro de 1901 e 22 de Fevereiro de 1927, data em que foi transferido para a Paróquia de S. Vicente de Abrantes. Foi, por diversas vezes, Presidente da Câmara Municipal de Sardoal.